Folha de S. Paulo


'Aquarius', filme com Sonia Braga, é indicado à Palma de Ouro em Cannes

Um som familiar ao redor. Após oito anos, o português com sotaque brasileiro volta a ser ouvido na competição principal do mais importante festival de cinema do mundo.

Sotaque pernambucano, mais exatamente. "Aquarius", novo filme do diretor recifense Kleber Mendonça Filho (de "O Som ao Redor") irá disputar a Palma de Ouro no Festival de Cannes. A mostra, que acontece entre 11 e 22 de maio no sul da França, anunciou na manhã desta quinta (14) os concorrentes.

"O filme vai ficar fora de controle, é fantástico. É muita gente, muita mídia, atenção. Tem de segurar o tranco porque a exposição é grande", diz o cineasta à Folha.

Fora de controle "Aquarius" já está. Ao menos, fora do controle do rótulo: Mendonça Filho evita conceituar seu novo filme e compará-lo ao anterior, o elogiado "O Som ao Redor" (2012), que usava uma rua do Recife como microcosmo para perpassar a história social do país.

"Não consigo responder como é o filme, como ele vai se encaixar na minha filmografia", afirma. "Não acho nem correto para um realizador colocar selos na sua obra antes que ela seja exibida."

Dos poucos detalhes se sabe da trama, "Aquarius" gira em torno de Clara (Sonia Braga), viúva sessentona que está em pé de guerra com uma construtora que planeja comprar seu apartamento para demolir o prédio em que ela mora, último bastião de seu estilo na avenida Boa Viagem, na capital pernambucana.

"É sobre a importância do arquivo, que não é só físico, é emotivo, cheio de experiências, transformações", diz o diretor. Segundo Mendonça Filho, o filme encontra eco no "Brasil dividido que está aí".

Sinopses anteriores descreviam o longa mais como uma incursão no fantástico, com a personagem de Sonia Braga, uma mulher cercada por livros, filmes e discos, sendo capaz de viajar no tempo. "Também é sobre isso, mas quero que as pessoas vejam."

Evasivas à parte, a escalação da atriz como a protagonista já mostra uma guinada na obra do diretor, que sempre buscou trabalhar com atores não tão conhecidos.

"A personagem é muito específica, surpreendente, uma pessoa 3D num filme não 3D. Tinha que ser alguém interessante e profissional", diz Mendonça. "Numa reunião com amigos, alguém disse 'Sonia Braga'. Respondi 'puta que o pariu, seria incrível'."

CONTRA ALMODÓVAR

"Na Estrada" (2012), dirigido por Walter Salles, foi a última participação do Brasil na disputa pela Palma de Ouro. O filme, contudo, é uma coprodução que conta também com Estados Unidos, Reino Unido, França, Canadá e Argentina, tem elenco americano e é todo falado em inglês.

Pertence também a Walter Salles o título de último diretor a levar uma produção 100% brasileira para a principal mostra de Cannes. Em 2008, "Linha de Passe", codirigido por Daniela Thomas, concorreu ao prêmio –acabou saindo com a estatueta de melhor atriz para Sandra Corveloni, que interpreta uma empregada doméstica no longa.

Apenas um filme nacional ganhou a Palma de Ouro: "O Pagador de Promessas" (1962), de Anselmo Duarte. A vitória desse drama social, que gira em torno de um devoto baiano, é tida como a maior conquista do cinema brasileiro.

Na edição deste ano, "Aquarius" é o único título latino-americano entre os 20 filmes da competição –13 europeus, três americanos, um canadense e dois asiáticos.

A sessentona de "Aquarius" irá disputar com a espanhola de meia-idade "Julieta", o aguardado novo filme de Pedro Almodóvar, e com o trintão Louis, escritor protagonista de "Juste La Fin du Monde", do prodígio canadense Xavier Dolan, que venceu o prêmio do júri em Cannes por "Mommy" (2014).

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A França tem quatro filmes, caso de "Ma Lout", de Bruno Dumont, figura conhecida no festival. Da Bélgica vem o novo dos irmãos Dardenne, "La Fille Inconnue".

O americano Sean Penn exibe "The Last Face", sobre dois membros de uma agência humanitária na África, com Charlize Theron e Javier Bardem.

Woody Allen abre Cannes, fora da competição, com "Café Society", ambientado na Hollywood dos anos 30 e protagonizado por Jesse Eisenberg.

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Todos os filmes da mostra competitiva de Cannes

"Toni Erdmann" (Alemanha), de Maren Ade
"Julieta" (Espanha), de Pedro Almodóvar
"American Honey" (Reino Unido), de Andrea Arnold
"Personal shopper" (França), de Olivier Assayas
"La fille inconnue" (Bélgica), de Jean Pierre Dardenne e Luc Dardenne
"Juste la fin du monde" (Canadá), de Xavier Dolan
"Ma Loute" (França), de Bruno Dumont
"Mal de Pierres" (França), de Nicole Garcia
"Rester vertical" (França), de Alain Guiraudie
"Paterson" (Estados Unidos), de Jim Jarmusch
"Aquarius" (Brasil), de Kleber Mendonça Filho
"I, Daniel Blake" (Reino Unido), de Ken Loach
"Ma'Rosa" (Filipinas), de Brillante Mendoza
"Bacalaureat" (Romênia), de Christian Mungiu
"Loving" (Estados Unidos), de Jeff Nichols
"Agassi" (Coreia do Sul), de Chan-Wook Park
"The last face" (Estados Unidos), de Sean Penn
"Sieranevada" (Romênia), de Cristi Puiu
"Elle" (Holanda), de Paul Verhoeven
"The neon demon" (Dinamarca), de Nicolas Winding Refn


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