Folha de S. Paulo


crítica

Diretor francês faz de filme doce fantasia sobre miséria afetiva

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Quando o cinema francês se volta para a periferia das grandes cidades, costuma destacar o crime e a violência. Não é o caso de "Fique Comigo", quinto longa-metragem de Samuel Benchetrit, cujo ponto de partida são alguns contos semiautobiográficos escritos pelo diretor.

Benchetrit mostra a miséria afetiva e existencial dos moradores de um edifício decrépito –tipos invariavelmente solitários, frágeis e taciturnos. Dirige-lhes um olhar empático, mas isento de comiseração.

O edifício é palco de três histórias improváveis entre os personagens, nas quais surge e se desenvolve um vínculo entre eles. A narrativa recusa o realismo, mergulhando numa estranha e doce fantasia com momentos de comédia e drama.

O ponto de partida dessas histórias são três encontros, cada um deles reunindo dois personagens.

O astronauta norte-americano John McKenzie (Michael Pitt) cai literalmente do céu e sua nave aterrissa no teto do edifício. Obrigado pela Nasa a permanecer incógnito até poder ser resgatado dias mais tarde, ele busca refúgio no apartamento de Hamida (Tassadit Mandi), uma senhora argelina cujo filho está na prisão.

Divulgação
Cena do filme 'Fique Comigo
Cena do filme 'Fique Comigo'

Apesar da situação absurda e mesmo sem falar a mesma língua, os dois conseguem se comunicar. Ela prepara um cuscuz para o inesperado hóspede que, em sinal de gratidão, tenta consertar um vazamento na cozinha.

O adolescente Charly (Jules Benchetrit, filho do diretor) é ignorado pela mãe e vive sozinho. Um dia, Jeanne Meyer (Isabelle Huppert) se muda para o apartamento ao lado. Atriz cujos dias de glória já ficaram no passado, ela tem a tristeza estampada no rosto, onde também resiste um pouco de altivez.

Os dois se aproximam e ela mostra ao garoto um de seus filmes numa cópia em VHS ("Um Amor Tão Fácil", de 1976, dirigido pelo suíço Claude Goretta, filme que revelou Huppert, que aqui se confunde com Meyer).

Se o astronauta é um substituto do filho de Hamida, a atriz é uma substituta da mãe ausente de Charly.

ENFERMEIRA

A última dupla é formada por Sternkowitz (Gustave Kervern) e uma enfermeira (Valeria Bruni-Tedeschi). Cadeirante, ele só sai de casa à noite, longe dos olhares dos vizinhos, para ir a um hospital próximo, onde mata a fome com petiscos que compra numa máquina.

Numa saída dessas, conhece a enfermeira, quando ela faz uma pausa para fumar um cigarro. Todas as noites ele vai encontrar essa mulher tímida e sonhadora, passando por fotógrafo para poder se aproximar dela.

Com diálogos concisos, planos longos e movimentos de câmera sóbrios, Benchetrit constrói uma narrativa depurada e poética, extraindo o melhor dos atores.

FIQUE COMIGO
(Asphalte)
DIREÇÃO: Samuel Benchetrit
ELENCO: Gustave Kervern, Isabelle Huppert, Michael Pitt, Valeria Bruni-Tedeschi, Tassadit Mandi, Jules Benchetrit
PRODUÇÃO: França, 2015, 12 anos
QUANDO: em cartaz


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