Folha de S. Paulo


Documentário americano toca no curioso tabu da masturbação

O diretor americano Nicholas Tana fez um documentário inteirinho sobre masturbação. E ele não quer que riam disso.

"É ironicamente engraçado. Mas precisamos fazer as pazes com a nossa sexualidade", diz o americano, que dirigiu "Sticky: A (Self) Love Story" -algo como "Pegajoso: Uma História de Amor (Próprio)".

Desde fevereiro, o filme está disponível, em inglês, em plataformas de vídeo sob demanda como iTunes e, segundo o diretor, deve chegar ao Brasil em breve, já que a Globosat comprou os direitos de exibição.

"Sticky" recorre a sexólogos, médicos, legisladores, comediantes, atores pornô, religiosos e educadores para tentar responder a seguinte pergunta sobre masturbação: "Por que é tão difícil falar sobre um ato que todo mundo pratica?"

Divulgação
Pôster do documentário
Pôster do documentário "Sticky: A (Self) Love Story", de Nicholas Tana

A resposta, claro, passa pelo tabu religioso, que confinou a masturbação –o prazer sexual, em geral– às páginas do pecado. O filme entrevista padres, rabinos, monges e imãs para sondar o atual status do onanismo nas pregações.

As opiniões divergem. Para os budistas, é um gasto de energia. O rabino ressalva: "Se Deus quisesse que não nos masturbássemos, teria nos criado com braços curtos", diz no filme.

Das pregações, a interdição passa para as fichas policiais: pego se masturbando num banheiro de cinema pornô, Paul Reubens, criador do personagem Pee-wee Herman, foi preso e viu sua carreira como comediante de sucesso escorrer pelo ralo. No Estado do Alabama, mostra o filme, é proibido manter uma sex shop, aquelas lojas repletas de itens para quem também deseja uma diversão solitária.

Das fichas policiais, o filme também leva o tema para a política.

Detém-se, por exemplo, no caso de Joycelyn Elders, uma espécie de ministra da Saúde dos EUA -a primeira mulher negra no posto- que foi forçada a deixar o cargo em 1994 ao insinuar que talvez fosse melhor que as escolas americanas passassem a lecionar sobre masturbação como forma de educação sexual de jovens num país que registrava altos índices de doenças sexualmente transmissíveis e gravidez precoce.

Foi um escândalo para o então presidente, Bill Clinton, que não quis se ver envolvido na polêmica.

"Ironicamente, ele quase perdeu o seu mandato justamente porque praticou atos libidinosos com a estagiária", diz Tana. "É até possível que todo o ato em si envolvesse masturbação."

Tana, inclusive, tentou obter uma resposta de Clinton, hoje empenhado em tentar eleger sua mulher, Hillary, para a presidência dos Estados Unidos. Não teve resposta, segundo ele.

CEREAL MATINAL E VIBRADORES

A seriedade do assunto, contudo, não impede que o tom do filme tenha lá seus momentos de humor -especialmente nos momentos que vasculha a história.

"Sticky" mostra, por exemplo, que os vibradores modernos são sucessores de máquinas usadas no século 19 para coibir os sintomas de mulheres tidas como acometidas por histeria.

E sabe aquele cereal matinal à base de flocos milho, o Corn Flakes? Bem, há uma história grudenta por trás dele: seu inventor, John Harvey Kellogg, acreditava que uma tigela matutina de seu açucarado cereal poderia repelir a voracidade sexual, prejudicial à saúde.

Trechos de filmes também mostram a forma como o cinema mostra o assunto: em geral o relacionado a alguma perversão ("O Exorcista", "Cisne Negro") ou à vergonha ("Picardias Estudantis")

Tana diz que no começo pensou em fazer o filme no estilo "mockumentary", documentário de zombaria, mas depois percebeu a "seriedade do assunto", segundo ele: um dos exemplos dados por "Sticky" é o de um garoto se matou após ter sido alvo de bullying por ter sido flagrado pelos colegas se masturbando no banheiro da escola.

Ao todo, foram nove anos para completar o filme: "O assunto é delicado, muitos dos que gostaríamos de entrevistar não toparam participar. É um tema que afugenta as pessoas: relacionam a sexualidade infantil."

Também foi difícil conseguir que comprassem a ideia: de um executivo da indústria cinematográfica chegou a ouvir que não bancaria o projeto porque não queria ser demitido.

"É uma questão que vai muito além do tabu", diz o diretor. "Masturbação mexe com fantasia, com lugares que nem todos querem acessar."


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