Folha de S. Paulo


'Se nada mudar, matarão um El Chapo e surgirá outro', afirma Wagner Moura

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Uma semana após concorrer ao Globo de Ouro de melhor ator em série dramática por "Narcos" –troféu que ficou para Jon Hamm, de "Mad Men"–, Wagner Moura voltou a Los Angeles.

Agora para divulgar a segunda temporada do seriado, que pode ser uma das últimas para o brasileiro, já que o Pablo Escobar de verdade foi morto pela polícia colombiana em 1993, 18 meses após os eventos retratados no fim do primeiro ano de "Narcos".

"Estou preparado, mas ainda não sabemos se [a morte de Escobar] será nesta temporada", revela Moura. O brasileiro gravou quatro episódios da série e retornou à Colômbia para terminar, até maio, os seis capítulos restantes. Antes disso, encontrou a Folha, no domingo (18).

Kevork Djansezian/Getty Images
BEVERLY HILLS, CA - JANUARY 10: 73rd ANNUAL GOLDEN GLOBE AWARDS -- Pictured: Actor Wagner Moura (L) and Sandra Delgado arrive to the 73rd Annual Golden Globe Awards held at the Beverly Hilton Hotel on January 10, 2016. (Photo by Kevork Djansezian/NBC/NBCU Photo Bank via Getty Images) ****FOTO COM CUSTO PARA ILUSTRADA**** ***DIREITOS RESERVADOS. NÃO PUBLICAR SEM AUTORIZAÇÃO DO DETENTOR DOS DIREITOS AUTORAIS E DE IMAGEM***
O ator Wagner Moura junto a sua mulher, Sandra Delgado, na entrada da cerimônia do Globo de Ouro

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Folha - Como foi a experiência no Globo de Ouro?
Wagner Moura - Não estava esperando que "Narcos" fosse ser indicado. Mas foi uma surpresa? Não. A TV está cheia de coisas boas, mas acho que a gente fez uma série muito boa e diferente. Sentei na mesa do Globo de Ouro tranquilo [risos].

Não passa nada diferente na cabeça de alguém que saiu de uma cidade pequena da Bahia se ver indicado em Hollywood?
Claro. Carreguei balde d'água na cabeça em Rodelas. Mas tenho trabalhado para isso. É o prêmio mais importante a que já fui indicado. Kevin Costner veio falar comigo. Muita gente me procurou.

Alguém de quem você é fã?
O diretor de "Juno", Jason Reitman. Ele disse: "A série é demais, e você está foda" [risos]. Respondi: "Também curto seu trabalho. Vamos trocar telefone?" [mais risos].

Já mudou algo já na sua carreira por causa de "Narcos"?
Não. Quando terminar a segunda temporada, vou dirigir "Marighella" no Brasil como planejado. Há pressão para estar mais em Los Angeles, mas não estou nessa. Se Jason Reitman me chamar para um filme, vou na hora.

Qual a grande diferença na nova temporada de "Narcos"?
Será mais focada nos protagonistas. Tata [Escobar, vivida pela mexicana Paulina Gaitán] terá mais destaque. É sobre Pablo fugindo e tentando manter a normalidade quando todos querem matá-lo.

Considera a indicação um "tapa na cara" porque reclamaram do seu sotaque no Brasil?
Sei o que fiz e tenho segurança. Não comecei ontem nesta parada, entendeu? Com indicação ou sem indicação, estou tranquilo. Fiz um trabalho maneiro e estou feliz com ele. Acho que podemos discutir Brasil, mas não sei se quero chegar a esse ponto. Estamos num momento no país em que nada pode dar muito certo hoje em dia. Sempre tivemos esse sentimento, mas hoje está mais presente que nunca. Ao mesmo tempo, sei que muita gente torceu por mim. Teve uma torcida que falou: "Esse cara é brasileiro, aprendeu uma língua, foi indicado ao Globo de Ouro e é nosso". Isso é o que vale.

Leu a entrevista de Sean Penn com o traficante El Chapo?
Não. Fui surpreendido porque saiu no dia do Globo de Ouro e várias perguntas ali foram sobre isso. Fiquei tão chocado como qualquer um.

Acha que o artista pode se colocar no papel de um jornalista?
Acho que pode. Sean Penn pode fazer o que quiser. Tem um limite que o artista precisa responder, claro. Lembro que [o cineasta] João Moreira Salles, quando ajudou o [traficante] Marcinho VP, foi bastante criticado [Salles teria oferecido pagamento em troca da produção de um livro biográfico sobre o traficante]. É uma fronteira bastante delicada. Não julgo nenhum artista que vai a fundo para entender alguma coisa ou fazer sua arte. Particularmente, não me encontraria com um criminoso procurado.

Por quê? Receio pessoal?
Sim. Não quero me envolver com um cara procurado pela Justiça. Tenho certeza de que El Chapo é maneiro para a família e os amigos. O fato de ser responsável pela morte de muita gente não significa que não seja um ser humano complexo. Mas não me envolveria.

Acha que "Narcos" influenciou El Chapo a se aproximar de artistas para fazer um filme sobre a vida do traficante?
Acho que devem ter visto "Narcos", sim. Esses caras têm Netflix. E, no mundo criminal, El Chapo é o traficante mais conhecido depois de Pablo Escobar. Não sei, estou apenas especulando. No entanto, há algo mais profundo sobre isso. El Chapo foi preso, não sei quantas pessoas mortas em Sinaloa e Juaréz... Enquanto a política em relação às drogas não mudar, isso não vai acabar nunca. Vão matar um El Chapo e surgirá outro. Nada vai mudar e as pessoas vão continuar morrendo em países periféricos, produtores e exportadores de drogas. A política antidrogas que vem dos Estados Unidos é comprovadamente um fracasso e tem levado muitos jovens da América Latina à morte.


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