Folha de S. Paulo


Quarenta anos após 'Horses', Patti Smith escreve livro 'sobre o nada'

Ao terminar "Só Garotos" (2010), livro de memórias sobre seus anos ao lado do fotógrafo Robert Mapplethorpe (1946-89), Patti Smith queria escrever "sobre o nada", sem amarras cronológicas ou roteiro. O resultado é "M Train", que acaba de sair nos EUA e ganhará edição brasileira (ainda sem data de lançamento) pela Companhia das Letras.

No livro, o leitor pega carona nos sonhos e viagens da poeta e musa do punk, indo parar nos cafundós da Guiana Francesa, nos túmulos de seus ídolos e no seu café preferido em Nova York.

"Robert pediu para eu escrever 'Só Garotos' um dia antes de morrer, foi uma responsabilidade tremenda, nunca tinha feito um livro de não ficção. Tive uma grande preocupação com cada pessoa, com a cronologia, a atmosfera das épocas, nossa relação", lembrou Patti, 68, num evento organizado pela Library Foundation de Los Angeles na semana passada.

"Por um tempo, só quis escrever sem ter agenda. Meio que uma grande divagação irresponsável", continuou, rindo. "Foi quase um experimento. Peguei minha caneta e escrevi inspirada por sonhos, continuei nesse trem mental até chegar a um destino não planejado. Foi libertador."

Maud Bernos
Música: a cantora, escritora e poeta Patti Smith. (Foto: Maud Bernos) *** DIREITOS RESERVADOS. NÃO PUBLICAR SEM AUTORIZAÇÃO DO DETENTOR DOS DIREITOS AUTORAIS E DE IMAGEM ***
A poeta e cantora Patti Smith, que lança o livro de memórias 'M Train', em imagem de 2014

A primeira parada do livro é numa cidade de fronteira entre a Guiana Francesa e o Suriname, para ver as ruínas de uma prisão que aparece em "Diário de um Ladrão", de Jean Genet (1910-86), um de seus autores favoritos.

Ela vai com seu então marido, o guitarrista Fred Sonic Smith (morto em 1994), com a missão de coletar algumas pedras para mandar a Genet, que nunca visitou o local.

Ao final da viagem, que inclui um motorista preso, uma parada de Carnaval e muitos militares, os dois chegam a tirar fotos para solicitar visto de entrada no Brasil, e as imagens estão reproduzidas no livro, assim como muitas outras tiradas por Smith.

"Tenho vários problemas técnicos, de direita e esquerda. E uso uma Polaroid, a forma mais simples que se pode ter. É perto e longe e pronto. E me levou um mês para aprender", disse a cantora, fazendo a plateia rir.

Patti falou de seu amor pelos livros e que decidiu ser escritora ao ler "Mulherzinhas" (1868), de Louisa May Alcott, cuja protagonista escreve romances. Quis trabalhar numa livraria ao ver "Cinderela em Paris" (1957), com Audrey Hepburn no papel de balconista de uma livraria no Greenwich Village, em Nova York. "Era meu sonho, eu tinha até as mesmas roupas que ela."

É nesse bairro que a poeta frequentou por anos seu café predileto, o 'Ino. Uma foto sua sentada na sua mesa favorita é a capa de "M Train". No livro, ela também fala de sua obsessão por seriados, especialmente histórias de detetives como "The Killing" e "Law & Order" (ela fez uma ponta nesta série em 2011).

40 ANOS DE 'HORSES'

"M Train" é lançado no mesmo ano em que o álbum de estreia de Patti, "Horses", um dos mais influentes no movimento punk nova-iorquino, completa quatro décadas.

Atrelada à turnê do livro, a artista tem feito shows com o repertório inteiro do disco.

"Quando comecei a fazer performances em 1971 e quando finalmente lancei 'Horses', a ideia era de apenas criar espaço e inspirar gente nova. Não pensava em fazer outros discos, apenas em voltar para minha poesia", disse a cantora, que hoje soma mais uma dezena de álbuns.

SÉRIE DE TV

Patti Smith está adaptando "Só Garotos" para o canal a cabo Showtime. Ela vai coescrever e coproduzir com John Logan, criador de "Penny Dreadful".

"Um seriado vai nos permitir explorar os personagens de forma mais profunda, desenvolver histórias além do livro e permitir uma apresentação pouco ortodoxa", disse Patti.

M TRAIN
AUTORA Patti Smith
EDITORA Knopf (edição em inglês)
QUANTO US$ 25 (R$ 93) e US$ 12 (R$ 45, e-book); 253 págs.


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