Folha de S. Paulo


Cineasta produz 1º longa-metragem brasileiro filmado apenas com celular

Charlote SP

Lema dos jovens e ambiciosos cineastas, a máxima glauberiana "uma câmera na mão e uma ideia na cabeça" não é uma frase tão fácil de pôr em prática. Mais do que isso, é preciso uma poupança gorda, um bom patrocínio ou incentivo público. Na falta de qualquer um dos três, o diretor Frank Mora, 38, com uma ideia na cabeça, trocou as câmeras de cinema tradicionais por iPhones.

Entre locações, equipe e pós-produção, ele gastou cerca de R$ 80 mil para fazer "Charlote SP", primeiro longa-metragem brasileiro apenas com imagens captadas por celular. O valor é mínimo se comparado a outras produções nacionais de baixo orçamento –"O Som ao Redor" (2013), de Kleber Mendonça Filho, por exemplo, custou em torno de R$ 2 milhões— e até a filmes feitos "a jato", como "Obra-Prima", de Daniel Filho, rodado em dois dias com R$ 450 mil.

"Achei que ia perder tempo demais tentando editais, então resolvi fazer de outra forma. Pesquisei e vi que era possível filmar com ótima qualidade com o celular", conta o cineasta paulista, que estreou nas telas com o documentário "Ponto de Virada" (2009), produzido também sem leis de incentivo, que virou série na TV Cultura.

Nos moldes da comédia dramática americana "Tangerine", queridinha no festival de cinema de Sundance deste ano, a produção foi filmada com quatro telefones da Apple, dos modelos 4 e 5. O resultado, é claro, é bem menos sofisticado em relação a um filme convencional e esbarra em problemas na captação de áudio e de imagens em ambientes escuros.

Por causa disso, a maior parte da história se passa durante o dia. Já o som passou por uma limpeza na finalização, mesmo assim aparece abafado ou com ruídos em alguns momentos.

Reprodução
Charlote (Fernanda Coutinho) em cena do filme
Charlote (Fernanda Coutinho) em cena do filme "Charlote SP"

Mas filmar sem o robusto aparato de câmeras tem suas vantagens: "Com elas, precisaríamos de uma pré-produção muito maior. Com celulares, em lugares públicos, ninguém reparava que estávamos gravando", diz Mora.

"A maior limitação técnica não eram os iPhones, mas o orçamento. Sempre vi as vantagens de se fazer dessa forma muito maior do que os pontos negativos."

O longa narra a trajetória de Charlote (Fernanda Coutinho), uma modelo internacional que, após anos sem fincar raízes, resolve voltar a São Paulo. No Brasil, reencontra o amigo Marcelo Scorcesar (Guilherme Leal), um cineasta tentando engatar a carreira e que lhe ajuda a redescobrir a cidade. A ficção se confunde com a história da amizade do diretor com a própria Fernanda, que também foi modelo na vida real.

Os ex-pilotos de Fórmula 1 Damon Hill e Johnny Herbert e o escritor Evandro Affonso Ferreira fazem participações especiais. A trilha sonora é de Kiko Zambianchi.

Mora tenta, agora, emplacar o filme em festivais nacionais e de fora do país. Não há data prevista de estreia.

"É claro que o fato de ter sido feito com iPhones é um dos motivos para ver o filme, mas não quero que seja o principal. Há muita gente com boas ideias, mas o cinema é uma coisa cara, limitadora. Acho que esse tipo de projeto abre novas possibilidades", afirma.


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