Folha de S. Paulo


MV Bill grava clipe em 360º, com formato tipo Google Street View

"Só Deus Pode Me Julgar"

A perspectiva é a de estar no guidão da bicicleta de MV Bill, que pedala por uma rua estreita. Ao olhar para um lado, vemos barracos. Do outro, um muro pichado. Abaixo, a roda gira sobre o chão.

Todos os ângulos estão integrados com recursos de realidade virtual no clipe da música "Só Deus Pode Me Julgar", de MV Bill, lançado no YouTube nesta quinta (22).

Não é preciso ter óculos de realidade virtual para acompanhar o rapper em uma volta pela favela onde vive, a Cidade de Deus, na zona oeste do Rio de Janeiro. O YouTube dá suporte a vídeos gravados em 360º desde março.

Na tela do computador, o espectador pode explorar o clipe usando setas que lembram as do Google Street View (serviço que possibilita um passeio virtual por cidades em fotos panorâmicas). No aplicativo do YouTube no smartphone, você mexe o aparelho, e a câmera acompanha.

O efeito é mais nítido com óculos especiais, feitos de papelão, onde o aparelho celular é encaixado. O usuário acopla o smartphone aos óculos (equipados com lentes especiais) e clica o "play".

"Só Deus Pode Me Julgar"

Entre as empresas que produzem esse acessório está a Cardboard, do Google. Foi para promovê-lo que fabricantes do produto no Brasil convidaram MV Bill para gravar.

Enquanto pedala, o rapper canta: "É! Mantenho minha cabeça em pé/ Fale o que quiser, pode vir que já é".

DECLARAÇÃO DE GUERRA

Estará certo quem achar os versos familiares. A música é do CD "Declaração de Guerra", de 2002. Para comemorar seu 13º aniversário, Bill quis gravar novo clipe. A canção, que marcou sua carreira, reflete sobre o Brasil da época: desigualdade, hipocrisia social, corrupção.

Não que não tivesse músicas novas para cantar –ele lança seu novo CD, "Contemporâneo", em novembro.

O rapper, também fundador da ONG Cufa (Central Única das Favelas), mantém o pendor pela denúncia da hipocrisia social. Quis repetir a música para lembrar que ela ainda é atual. "Misturamos uma coisa inédita, a realidade virtual, com outra que não perde ineditismo: as falcatruas e a corrupção da política brasileira", diz MV Bill.

O artista e ativista tem um histórico de clipes polêmicos. "Soldado do Morro" (2000), que mostra garotos empunhando armas, foi considerado apologia ao crime.

Ainda que seja menos ousado do que os anteriores, este tem o tom de denúncia característico do rapper.

Escolheu mostrar uma parte da favela, conhecida como Pantanal, que considera ignorada pelo poder público e proibida para quem não é morador, já que, segundo ele, é dominada pelo tráfico.

Na filmagem do clipe em realidade virtual, as câmeras –no caso de "Só Deus Pode Me Julgar", seis, acopladas ao guidão da bicicleta– registram o que acontece ao redor.

Quando MV Bill filmou, em agosto, nenhum brasileiro havia lançado clipe nesse formato. Mas a produção atrasou e, desde então, ao menos dois já estão no ar: "Só Mais um Dia", do rapper mineiro Flávio Renegado, e "Levanta o Copo", do cantor sertanejo paranaense Michel Teló.


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