Folha de S. Paulo


No ambicioso 'Sicario', Villeneuve adentra a 'terra de ninguém' do tráfico

Trailer de "Sicario"

Filmes ou séries sobre o narcotráfico sempre correm o risco de cair no charme dos próprios protagonistas. Seja o lado Robin Hood do monstruoso Pablo Escobar da série "Narcos", seja o Tony Montana de Al Pacino em "Scarface", os Todo-Poderosos dos carteis compreensivelmente produzem tramas fascinantes e violentas.

Para evitar essa armadilha, o diretor canadense Denis Villeneuve ("Os Suspeitos") e o roteirista Taylor Sheridan radicalizaram em "Sicario: Terra de Ninguém".

O filme, que estreia no Brasil nesta quinta-feira (22) depois de aclamado no Festival de Cannes, em maio, e da estreia nos Estados Unidos, onde bateu recorde de melhor média de público do ano, deixa de lado os bandidões para centrar na agente do FBI Kate Macer (papel da atriz inglesa Emily Blunt).

Durante uma batida em busca de reféns no Estado americano do Arizona, Macer e sua equipe descobrem dezenas de corpos escondidos nas paredes de uma casa.

Em seguida, a agente é indicada pelos superiores para servir em uma ação antidrogas ao lado de um misterioso membro do ministério da defesa (Josh Brolin) e um consultor colombiano (Benicio del Toro) com uma ideia particular de justiça.

A ideia é dizimar o cartel responsável pelas mortes no Arizona em missões que começam com uma sensacional invasão –apoiada pelos governos americano e mexicano– a Cidade de Juarez (México), na fronteira com os Estados Unidos, e operações mais violentas e sujas.

NOVOS MONSTROS

"Não sou especialista sobre o combate às drogas", afirma Villeneuve à Folha. "É um problema complexo e gigante, mas me fascina como os americanos reagem a ele, porque acham que podem resolver tudo com violência excessiva e nadando na sujeira da legalidade."

Para Del Toro, que já participou de diversas produções sobre o assunto, entre elas "Traffic" (2000) e, mais recentemente, como Pablo Escobar em "Escobar: Paraíso Perdido" (2014), o longa não apresenta soluções, mas destrincha táticas ineficientes usadas pelos governos.

"Ele pergunta se esse é o caminho que vamos seguir. Vamos enviar tropas para outros países, fazer o que desejarmos e voltar para nossas trincheiras?", questiona o ator porto-riquenho.

"Aprendi muito sobre os dois lados do problema vivendo o traficante, o policial, o usuário viciado, o que usa drogas por diversão... Algo precisa ser feito, mas precisam admitir que desse modo não está dando certo, apenas criando novos monstros."

PAPEL PRINCIPAL

Baseado nas histórias às quais o irmão de Sheridan tinha acesso na Cidade do México nos quatro anos em que trabalhou como jornalista na capital do país, "Sicario" (como se chamam os assassinos dos carteis) foi concebido há três anos, com um orçamento modesto de US$ 30 milhões. E quase não saiu conforme o planejado.

"O estúdio falava que o filme teria muito mais dinheiro se fosse um homem no papel principal", conta Blunt.

"Fiquei desapontada, claro, mas Denis e Taylor foram firmes na sua decisão. Já me acostumei a ouvir isso. As mulheres precisam provar que são bancáveis e papéis como esses estão deixando de ser raridade."

Villeneuve confirma que o assédio para mudar o sexo da sua protagonista existiu, mas sem exageros. "Quantas vezes vimos filmes que retratam um policial antidrogas? A mudança retiraria a fragilidade e o que existe de diferente naquela situação."

"Na guerra contra as drogas não há sexo ou idade. Todos são mortos da mesma maneira", continua. "E não estou dizendo que a mulher é uma super-heroína. Ela merece ter o mesmo direitos e deveres que o homem."

Para encontrar essa personagem que trafega sempre no lado certo da lei repentinamente jogada no lamaçal cinzento e corrupto do combate ao narcotráfico, a atriz britânica entrevistou diversas agentes pessoalmente e via videoconferência.

"Queria saber como essa profissão afeta o casamento e a relação com os filhos. Descobri que essas mulheres são muito fortes, mas solitárias, tímidas e tristes", explica Blunt. "Uma delas faz parte do esquadrão da Swat [polícia de elite dos EUA], mas assiste [à série inglesa] 'Downton Abbey' todas as noites para relaxar do dia a dia."

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