Folha de S. Paulo


CRÍTICA

Diretor chileno fascina a partir do desconforto em 'O Clube'

Em menos de uma década, o nome do realizador chileno Pablo Larraín emergiu e conquistou espaço e premiações em importantes festivais com releituras de fantasmas da ditadura de Pinochet que desconcertaram pela inovação de seus pontos de vista.

Com "O Clube", vencedor do Urso de Prata no Festival de Berlim deste ano, o diretor de "No" aborda o tema do abuso sexual por padres católicos. Ao tomar distância da questão histórica que atraiu a atenção e deu forma a seu cinema, Larraín não perde nada de sua capacidade de incomodar.

O título irônico refere-se a uma casa, num vilarejo perdido à beira-mar, onde se isolam quatro padres acusados de pedofilia e uma religiosa que cuida da rotina doméstica e assegura o isolamento.

A estabilidade do grupo é garantida pela imposição de uma lei do silêncio, por hábitos monásticos e pelo bloqueio a qualquer contato com a pequena comunidade próxima à casa.

Divulgação
O Clube (2015)
Cena de "O Clube", filme do diretor Pablo Larraín

A repressão do desejo homossexual estende-se à mortificação dos afetos. O único sentimento que eles se autorizam é por um cão galgo, cujas vitórias em corridas são apreciadas pelo grupo à distância.

Essa ordem, no entanto, logo será perturbada pela chegada de um novo hóspede, pela intromissão de uma de suas vítimas e pela entrada em cena de um religioso, diretor de consciência, que passa a questionar, impor responsabilidades e atribuir culpas.

O ambiente claustrofóbico intensifica o sufocamento moral ao qual os personagens parecem condenados. O papel do diretor de consciência, anunciado como um anjo negro de grande beleza, será equivalente ao do visitante em "Teorema", de Pier Paolo Pasolini: confrontar cada indivíduo a sua verdade e a suas sombras.

Do mesmo modo que em "No" a aparência de vídeo antigo da imagem agregava uma temporalidade e um distanciamento à história, em "O Clube" a fotografia também provoca um efeito narrativo especial.

Seja em externas ou em interiores, em cenas diurnas ou noturnas, faça chuva ou faça sol, a luminosidade opaca que banha cada segundo do filme dificulta a visão clara da face dos personagens, impede de enxergar com clareza o que os move e, sobretudo, nos impossibilita distinguir o bem do mal.

Essa opacidade só amplifica o sentimento misto de repulsa e consideração que sentimos pelos personagens, em sua miséria, em sua humanidade, em sua queda.

Sem sensacionalismo, sem melodrama e sem condenação a priori, Pablo Larraín consegue fazer com "O Clube" um filme cujo fascínio brota do desconforto que ele provoca.

O CLUBE (El Club)
DIREÇÃO Pablo Larraín
ELENCO Roberto Farías, Antonia Zegers, Alfredo Castro
PRODUÇÃO Chile, 2015, 16 anos
QUANDO estreia nesta quinta (1º)


Endereço da página: