Folha de S. Paulo


Livro de ilustrações 'São Paulo Infinita' busca brechas da cidade

Em pequenas fendas da cidade, Juliana Russo, 39, encontrou uma São Paulo infinita. Suas impressões de camadas submersas da metrópole foram tracejadas em um livro que leva esse nome e será lançado na próxima quarta (7), pela editora Gustavo Gili.

Convidada em maio do ano passado para fazer uma espécia de guia paulistano, a ilustradora –também paulistana– chegou a hesitar. Acostumada a desenhar a rotina da cidade (é integrante do Urban Sketchers, grupo de ilustradores que se propõem a registrar a cidade), não via como fazer algo diferente dos roteiros que proliferam nas bancas e livrarias.

Aos poucos, em seus passeios rotineiros, o livro foi surgindo, diz. Partindo da esquina de sua casa na zona oeste até se expandir a regiões mais distantes, nas quais buscava um ponto de familiaridade.

Com um banquinho, chegava a ficar de quatro a cinco horas em uma locação. Ao final do dia, havia falado com todas as pessoas da redondeza.

"É um processo bem interessante num momento em que todo mundo está raivoso com São Paulo. Vou aos lugares e acho incrível uma escadaria esquecida. É um reencontro com uma camada da cidade, da pequena gentileza urbana que fica submersa nas camadas de agressividade."

Entre os cantos retratados, em sua maioria turísticos, estão a Praça Benedito Calixto, o Beco do Batman –ambos na zona oeste de SP– e o Masp. Mas há também lugares menos óbvios, como a escadaria da rua Cotoxó, na Pompeia.

"O que eu podia fazer era minha versão da cidade. Lugares mais icônicos, como o Masp, já foram milhões de vezes retratados. Eu fiz meu desenho de um ângulo esquisito, para retratar minha voz. Ou retratei lugares que eu tenho uma relação, mas pouca gente conhece", diz a artista.

Feitos com guache, as ilustrações são na maior parte em preto e branco, com detalhes coloridos inseridos posteriormente, em geral de personagens fotografados que lhe chamavam a atenção.

"Eu subvertia o roteiro o tempo todo. Quando você vai para a rua, não sabe o que vai te aparecer. Quando desenha alguma coisa, às vezes outra coisa surge e te surpreende."

Duas de suas surpresas, um marceneiro da rua Xerentes, na Pompeia, e um chapeleiro da rua Augusta, morreram antes do livro ser publicado.

"Tenho essa coisa com a memória de São Paulo, de registrar lugares que depois de poucos meses deixam de existir. É como se meus desenhos fossem um último suspiro."

Como a marcenaria e a chapelaria, a abandonada escadaria da rua Cotoxó, lembra como exemplo, "tem cheiro de esquecido". "É nesses lugares empoeirados que você encontra essas brechas, essas memórias, a infinitude das paisagens e significados submersos em São Paulo."

SÃO PAULO INFINITA
AUTORA Juliana Russo
EDITORA Gustavo Gili Brasil
QUANTO R$ 69 (102 págs.)


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