Folha de S. Paulo


Com letras ácidas, maluco do Ministry fascina plateia do festival

Como já virou hábito no Rock in Rio, a noite dedicada às bandas de metal e hard rock foi das mais animadas.

É um público sempre empolgado e barulhento, que chega cedo para ver as bandas de abertura e tem como uniforme as indefectíveis camisetas pretas com estampas de suas bandas prediletas. Logo na primeira banda, a brasileira Noturnall, o público no palco Sunset era grande, pelo menos dez vezes maior do que o da banda Dônica, que abriu a noite anterior. Mais uma vez, os fãs de metal deram um banho de animação nos indies.

Em meio a tanto bom mocismo e rebeldia calculada, que bom ver um maluco de verdade no Rock in Rio: Al Jourgersen. Esse cubano de 56 anos comanda o grupo Ministry desde 1981, lançou 13 discos, e é a maior prova de resiliência do corpo humano em face ao abuso químico. Que não tenha morrido é um assombro. Que ainda consiga cantar num palco é um verdadeiro milagre da natureza.

Na noite de sábado, Jourgensen fez seu primeiro show no Rio de Janeiro acompanhado de uma ótima banda, que inclui nomes conhecidos da cena de metal como o baixista Tony Campos (Soulfly, Prong), o tecladista John Bechdel (Fear Factory, Killing Joke), o baterista Aaron Rossi (Prong) e os guitarristas Sin Quirin e Monte Pittman, que há anos toca com Madonna.

O Ministry vendeu muitos discos na virada dos anos 1980 para os 1990, fazendo uma poderosa mistura de guitarras pesadas e batidas eletrônicas. LPs como "The Land of Rape and Honey" (1988), "The Mind Is a Terrible Thing to Taste" (1989) e "Psalm 69" (1992) fizeram a ponte entre o heavy metal, o hardcore e a música eletrônica, e influenciaram bandas como Nine Inch Nails, Korn, Sepultura e Slipknot (integrantes do Korn, que se apresentariam depois do Ministry, viram o show da lateral do palco).

Mas a propensão de Jourgensen a viver perigosamente acabou prejudicando a carreira comercial da banda. A formação do Ministry sempre foi instável, e não foram poucas as brigas com parceiros. Alguns morreram —por suicídio, drogas ou até atropelados por um trem— e outros simplesmente desistiram. Mas Al continuou, firme e forte.

No show de sábado, o Ministry tocou 12 músicas em uma hora. Na primeira parte, a banda privilegiou canções lançadas em discos mais recentes. O repertório incluiu "Hail to His Majesty", "Permawar", "Rio Grande Blood" e "Lies, Lies, Lies". Um telão atrás do palco mostrava imagens chocantes de guerras e rostos de políticos norte-americanos, como o ex-presidente George W. Bush, alvo frequente das letras ácidas de Jourgensen, um crítico da direita americana.

Na parte final do show, Jourgensen chamou ao palco um velho conhecido, Burton C. Bell, líder e cantor da banda Fear Factory, para ajudá-lo numa sequência matadora de hits do auge comercial do Ministry: "N.W.O.", "Just One Fix", "Thieves" e "So What". O público, que não parecia conhecer as canções mais recentes da banda, se empolgou com as últimas, que passaram muito na MTV brasileira nos anos 1990. E Tio Al parecia feliz, vendo os fogos de artifício que anunciavam a abertura do palco principal. Que volte logo.

ANDRÉ BARCINSKI é jornalista e autor do livro "Pavões Misteriosos" (Três Estrelas)


Endereço da página:

Links no texto: