Folha de S. Paulo


Plínio Marcos levou para o palco histórias das suas rodas de samba

Não fazia cinco anos que o compositor e instrumentista Silvio Modesto, 71, havia deixado a capital fluminense para viver em São Paulo quando conheceu o dramaturgo Plínio Marcos. "Foi em 1970 ou 1971. Eu vendia bilhete de loteria, ele me viu passar na rua e disse, 'Ei, você tem cara de pagodeiro'."

Escritor sem trava na língua, Plínio era homem da rua e admirador do samba, levava para o palco histórias das "quebradas do mundaréu", termo que ele usou em texto no disco "Plínio Marcos em Prosa e Samba", relançado em 2012 pela Warner.

Os botequins eram um refúgio, os sambistas estavam sempre ao redor, e o autor escrevia com propriedade sobre os cordões paulistas, tendo criado um deles, a banda Bandalha, que nos carnavais saía do Teatro de Arena, no centro, com Etty Fraser, Tony Ramos e outros atores na rabeira.

Modesto conta que, naquele dia, foi convidado a um ensaio no Teatro de Arena, no centro. "Dois Perdidos numa Noite Suja" já tinha versão para o teatro e para o cinema, a peça "Navalha na Carne" estava proibida pela censura e, reconhecido pelo brilhantismo de seus dois principais textos, Plínio aproximava o samba e o teatro com o musical "Balbina de Iansã".

Entre 1970 e 1974, formou-se a roda, com a participação também de Geraldo Filme (1927-1995), Zeca da Casa Verde (1927-1994), Toniquinho Batuqueiro (1929-2011) e Talismã (datas de nascimento e morte desconhecidas).

Nas sessões de batuque em teatros paulistanos, Plínio não tocava e não cantava; mas lia seus textos entre uma música e outra. Depois, deixava o samba correr.

Único da turma ainda vivo, Modesto acabou integrando o elenco de "O Poeta da Vila e Seus Amores" (1977), no Teatro Popular do Sesi. O texto da peça era uma homenagem a Noel Rosa.

Para Modesto, o dramaturgo e parceiro era homem que "falava o que pensava", sem medo. "Aquilo, para mim, era muito forte; com ele, eu aprendi o que era ter dignidade", diz o músico.

Esse temperamento do autor também rendeu inimizades, e há quem reconheça nele traços de uma personalidade possessiva. Osvaldinho da Cuíca, 75, conta que passou "quase dez anos" distante, após uma desavença.

"Fui a um ensaio em 74, queria gravar uma música do Geraldo Filme; Plínio fez cena de ciúme e disse: "Não vai gravar, ninguém gravava música dele e agora todo mundo quer?"

Cerca de dez anos depois, veio a reconciliação, um aperto de mãos. No velório de Plínio em 1999, com a velha guarda toda ao redor do caixão, foi Osvaldinho quem puxou "Silêncio no Bexiga", também de Filme. "Silêncio, o sambista está dormindo." Ao telefone, com a voz prejudicada após dois derrames, ele canta a música inteira, comovido.


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