Folha de S. Paulo


Mostras celebram os 80 anos de Plínio Marcos, referência do teatro social

Plínio Marcos nunca fez "nada para agradar as pessoas", declarou o dramaturgo em entrevista a Jô Soares em 1988. Sua linguagem rude e naturalista, com diálogos enxutos e forte temática social, que dava voz a personagens marginalizados, foi o motor de toda uma geração do teatro brasileiro, de Leilah Assumpção a José Vicente.

"Ele mostrava uma realidade social com uma crueza e um talento que incomodavam muito", avalia o diretor Aderbal Freire-Filho.

Referência da dramaturgia social brasileira, Plínio Marcos de Barros faria 80 anos no dia 29, data que é celebrada, a partir desta quarta (16), em mostras em São Paulo e no Rio.

Em paralelo, o Teatro Garagem prepara a primeira montagem paulistana de "O Bote da Loba" –houve uma versão, no ano passado, do grupo Mercado Cênico, em Campo Grande. Trata-se da última peça acabada do dramaturgo, escrita em 1997, seu período final e místico.

Retrata uma cigana que tira cartas para uma socialite e envolve a cliente para desnudá-la, explica Anette Naiman, integrante do Garagem.

"O texto é um pouco autobiográfico, parte das experiências dele, que lia tarô para as pessoas", conta. A montagem deve estrear em novembro na sede do grupo, na Vila Romana (São Paulo).

Plínio começou no circo –aos 16, já era palhaço. Em 1958, na Santos natal, envolveu-se com o teatro por influência de Patrícia Galvão, a Pagu.

Foi funileiro, camelô, técnico da TV Tupi, jornalista, dramaturgo e ator (ficou marcada sua atuação na novela "Beto Rockfeller", de 1968). Também foi um dos autores mais censurados no país. "Barrela" (1959), baseada no caso de um garoto currado em uma cadeia de Santos, foi proibida por 21 anos.

"O que mais assolou a vida dele foram as proibições", diz o ator Silvio Guindane, curador do "Projeto Plínio Marcos - 80 anos". "Todas as peças dele foram, de alguma forma, censuradas", completa Freire-Filho. "Mesmo depois da ditadura, houve uma censura social. A linguagem dele era muito crua, cheia de palavrão."

Plínio só voltaria à moda na segunda metade da década de 1990, conta o dramaturgo Leo Lama, 50, filho mais velho de Plínio. Nos anos 1980, ia ele próprio às portas de teatros para vender seus textos. "Nessa época, as pessoas não queriam saber desse tipo de tema [social]. Foi um período difícil para ele", diz Leo.

MUITO A FAZER

Apesar das comemorações de 80 anos, o acervo do dramaturgo "não se encontra em local adequado", admite o filho Kiko Barros, 48, representante legal da obra de Plínio.

Boa parte do legado, conta o filho, está em caixas, num "armário grande" na casa da mãe dele –a primeira mulher de Plínio, a atriz Walderez de Barros, mãe dos três filhos do dramaturgo.

São manuscritos, fotos, recortes de jornal, cartazes e programas de peças antigas.

Segundo Kiko, a família busca parcerias, em especial com universidades, para cuidar do acervo, terminar sua digitalização e futuramente disponibilizar o material ao acesso do público. "Entendo que é da maior importância o acesso a essa obra. Então tem muita coisa para se fazer."

Muito da biografia e da obra de Plínio pode ser visto em www.pliniomarcos.com. Mas o site não é atualizado há cerca de cinco anos, diz Kiko. "O conteúdo infelizmente não evoluiu. E é uma plataforma antiga, a tecnologia precisa ser atualizada."

Também há o desejo de publicar todo o trabalho do dramaturgo. Em 1997, antes de sua morte, foi firmado um acordo com a Funarte para a edição da obra completa. Mas, em 2007, o projeto foi encerrado, pois "venceu o prazo da compra dos direitos de publicação", afirma à Folha, por e-mail, Francisco Bosco, presidente do órgão.

"A Funarte está em conversas já avançadas para retomar o projeto –mas falta acertar alguns pontos fundamentais. Até o final deste mês espero ter uma posição definitiva."

MOSTRAS

As oito décadas do dramaturgo dos marginalizados serão celebradas na mostra "Projeto Plínio Marcos - 80 Anos", que começa nesta quarta (16), em São Paulo.

São quatro montagens de textos do autor, além da estreia do monólogo "Plínio", no qual Roberto Bomtempo interpreta o dramaturgo.

Também haverá uma exposição com fotos e figurinos e um debate, que abre a programação, com artistas que trabalharam com Plínio ou foram influenciados por sua obra, explica Silvio Guindane, idealizador da mostra.

São nomes como Milton Gonçalves, Ary Toledo e Tanah Corrêa, amigos próximos do dramaturgo. Uma das montagens, "Prisioneiro de uma Canção" (2000), foi roteirizada e musicada por Leo Lama, filho do autor, a partir de textos do pai. "Agora eu vejo o Plínio mais como um parceiro", diz Lama.

A ideia é que, passada a mostra, as montagens façam temporada no Rio, em São Paulo e em Santos, e depois circulem por outras cidades brasileiras, conta Guindane –ainda não há, contudo, datas para as futuras sessões

No Rio, outro projeto, que também tem início nesta quarta, celebra a obra do dramaturgo: "Os Proibidos", dirigido por Aderbal Freire-Filho, traz leituras, palestras e uma exposição sobre trabalhos em teatro que foram censuradas durante a ditadura militar brasileira.

Dentro da programação, haverá a estreia de "Abajur Lilás", texto de Plínio, em montagem dirigida por Renato Carrera.


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