Folha de S. Paulo


'Humans of New York' desmistifica o Irã em nova série fotográfica

"Eu me apaixonei pela literatura. Tento ler por uma ou duas horas todos os dias. Só tenho uma vida para viver, mas, nos livros, posso viver mil."

A história poderia ilustrar mais uma das mais de cinco mil fotos do americano Brandon Stanton na página "Humans of New York", mas vem de Rasht, cidade do Irã. O fotógrafo retornou ao país neste mês após tê-lo visitado em dezembro de 2012, primeira excursão internacional com o projeto.

"O Irã tem um lugar especial no meu coração por ter sido a primeira viagem internacional que eu fiz com o 'Humans of New York'. Isso foi há três anos e eu sempre olhei para a coleção com um pouco de arrependimento, porque o 'Hony' ainda era novo e o trabalho ainda muito cru. Eu estava apenas começando a incluir citações nas fotos", explicou o Stanton na página do projeto. "Sempre quis retornar e desempenhar um trabalho melhor ao contar as histórias de iranianos comuns e estou animado em ter essa oportunidade."

De blazer vermelho, véu e calça jeans, uma jovem mostra uma obra na tela do celular, em Teerã. "Há um grande contraste entre minhas fantasias e minha vida. Eu uso a arte para diminuir essa diferença. Estou começando um novo projeto, no qual cubro corpos nus com tinta e os deito em telas. O corpo nu é muito natural para mim. É uma questão de verdade."

Stanton acrescenta a página da garota no Instagram à foto. Nos comentários, uma usuária comenta "Eu amo como o 'Hony' apresenta as pessoas iranianas, muito diferente do que vemos na mídia". A reação se repete em outras respostas.

Em outra foto, uma mulher de Namakabroud fala sobre a mudança cultural do país enquanto come pizza em um bar.

"As coisas estão mais livres. Há poucos anos, eu não poderia usar as roupas com as quais estão agora sem ser repreendida. Os véus estão se tornando mais coloridos e frouxos. As mangas, mais curtas, e as risadas, mais altas."

Ela diz que o Irã é um país muito jovem, com mais da metade da população abaixo dos 30 anos.

"Você já viu uma criança iraniana? Elas são as mais arteiras do planeta —diga não para elas. Diga a elas para não beijarem. Para não segurarem as mãos. Diga que se vistam inteiras de preto. Diga para não usarem o Facebook. Esse país está cheio de crianças iranianas levadas e curiosas e as pessoas que estabelecem as regras estão envelhecendo. Assim como os pais iranianos, elas estão ficando exaustas."

Na foto, o comentário mais curtido diz: "Sou iraniana e moro no Irã, mas é incrível ver meu próprio povo pelos olhos de Brandon".

*

Veja algumas das histórias retratadas por Brandon Stanton em sua segunda passagem pelo Irã:

"Eu gosto de sentar sozinha e pensar a respeito do mundo. Queria me formar em Filosofia, mas não há esse curso em nossas universidades. O único oferecido é 'Religião e Filosofia'. Nós não somos encorajados a decidir as coisas por nós mesmos. Toda a filosofia que temos deve ser pautada na existência de Deus. Eu mudei meu curso para Física. Ele ainda me permite pensar sobre o mundo e, se alguém quiser que eu fale que algo é verdade, precisa provar para mim com uma fórmula."

"Minha mulher tem um tumor cerebral e eu não vendo um terno há duas semanas. Estive com meu neto na semana passada e ele me pediu que lhe comprasse um chocolate, mas eu não tinha nada em meus bolsos. Precisei dizer a ele: 'Espere até seu pai chegar em casa'. Quis me afundar na terra."

"Estou tentando ser uma artista, mas meus pais não entendem. Mostrei uma pintura à minha mãe e perguntei se ela gostava. Ela disse: 'Acho que sim, mas por que tem um cigarro? Você fuma?'. Eu disse: 'Não, mãe. O cigarro representa a dor'. Ela perguntou: 'Nós não te amamos o suficiente?'."

As demais fotos podem ser conferidas no site do projeto.


Endereço da página: