Folha de S. Paulo


Casos médicos descritos por britânico Oliver Sacks inspiram peça de teatro

São poucos os estudiosos que conseguem popularizar temas árduos da ciência. Há quem o faça pelo humor ou pela espetacularização, mas o que tornou o neurocientista britânico Oliver Sacks célebre foi sua visão humanizada do relato médico. Ele descreve casos com compaixão e uma certa proximidade com pacientes.

No livro "A Mente Assombrada" (2012), sobre alucinações, Sacks chega a relatar sua própria experiência com drogas, casos que ele conta também na recém-lançada autobiografia "Sempre em Movimento".

Suas obras geraram filmes –"Tempo de Despertar" (1990) teve Robin Williams e Robert De Niro no elenco– e peças de teatro (Peter Brook dirigiu uma versão do livro "O Homem que Confundiu Sua Mulher com um Chapéu").

Também deram origem à montagem teatral "Do Lado Direito do Hemisfério", que a companhia mineira Afeta acaba de estrear em São Paulo.

"Sacks fala de pessoas 'impossíveis', com doenças que afetam o lado direito do cérebro e que são as menos estudadas", diz Nando Motta, diretor do espetáculo. "Quando ele descobre essas pessoas singulares, ele pensa mais em como é a vida do sujeito, como ele se encaixa na sociedade, do que no tratamento."

São recortes dos personagens descritos por Sacks: um agnóstico visual (quando o cérebro não interpreta imagens), um homem com síndrome de Tourette (que se manifesta por tiques) e outro com perda de memória recente.

Os casos aparecem menos como relatos narrativos e mais como performances. Assim, as cenas evidenciam os elementos teatrais, como o personagem que se descreve como "um lapso dramatúrgico".

Nando diz que o mergulho em Sacks o deixou mais sensível para identificar essas "pessoas singulares" no seu dia a dia. Conta que, ao acaso, conheceu duas pessoas com síndrome de Tourette, uma na rua, outra no metrô.

No início do ano, o diretor por pouco se encontrou com o neurologista, mas logo soube da doença do médico, e os planos não foram para frente.

Em fevereiro, Sacks publicou uma carta no jornal "The New York Times". Contava ter descoberto metástases não tratáveis de um câncer no fígado (diagnosticado havia nove anos) e que lhe restavam apenas alguns meses de vida.

Mas com um tom de otimismo: "Sinto-me intensamente vivo, e quero e espero que, no tempo que resta, eu possa aprofundar minhas amizades, dizer adeus aos que amo, escrever mais, viajar, se tiver força para tanto, alcançar novos graus de entendimento e de discernimento", escreveu.

No último dia 24, em outro texto no "New York Times", intitulado "Minha Tabela Periódica", Sacks dizia que tem se aproximado de metais e minerais: compara sua idade aos números atômicos de elementos químicos.

Tem sobre a mesa uma caixa com tálio (elemento 81), presente de seu 81º aniversário, e ganhou uma peça de chumbo pelos 82 anos, completos em 9 de julho. Acredita que não chegará aos 83, mas nutre uma queda pelo bismuto (o 83º). E guarda uma peça de berílio (elemento quatro) para se lembrar da infância e de "quanto tempo atrás começou minha vida, agora prestes a terminar".

DO LADO DIREITO DO HEMISFÉRIO
QUANDO qua., qui. e sex., às 20h; até 25/9
ONDE CCBB, r. Álvares Penteado, 112, tel. (11) 3113-3651/ 3652
QUANTO R$ 10
CLASSIFICAÇÃO 14 anos


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