Folha de S. Paulo


Autor de livro sobre epidemias diz que temeu 'micróbio' Borges

JULIANA GRAGNANI
ENVIADA ESPECIAL A PARATY

O argentino Diego Vecchio, escritor hipocondríaco assumido, disse nesta quinta (2) na Festa Literária Internacional de Paraty, a Flip, que teve "muito medo de ser fagocitado pelo 'micróbio' [Jorge Luís] Borges".

Vecchio dividiu o palco com o bósnio Sasa Stanisic, em mesa mediada por Joca Reiners Terron. Até a tarde de quarta (1), ainda havia ingressos disponíveis para a mesa, mas o público lotou a tenda principal nesta quinta (2).

Radicado na França, Vecchio, professor na Paris 8 e tradutor, é autor do livro de contos "Micróbios" (Cosac Naify, R$ 34,90, 192 págs.).

Seu livro narra histórias em que personagens convivem com diferentes tipos de doença em países diversos. Joca disse que as 'vidas imaginárias' de seu livro lembram as de Jorge Luis Borges; o argentino revelou, então, seu medo de ser comparado com o conterrâneo.

DOENÇA FAVORITA

Sasa arrancou risadas da plateia quando perguntou ao argentino se ele tinha uma doença favorita.

Vecchio contou apenas que estava preocupado em viajar para os "trópicos", ao Brasil. "Antes de vir, li uma informação muito interessante sobre Paraty: a cidade foi construída de maneira que os ventos não trouxessem micróbios do mar para a cidade", afirmou, provocando risos.

"Que eu saiba, Paraty foi construída assim para que não chegassem os piratas franceses!", comentou o mediador. "É a mesma coisa", arrematou o escritor hipocondríaco, que definiu a condição como a de uma pessoa "hipersensível".

"Como bom hipocondríaco, nunca vou ao médico."

IMIGRAÇÃO

Os dois escritores também debateram como ter emigrado de seus países influenciou a obra de ambos. Vecchio vive na França, mas escreve em espanhol.

Vítima da guerra da Bósnia (1992-1995), Sasa (pronuncia-se 'sasha') deixou o país com sua família aos 14 anos e radicou-se na Alemanha. O conflito deixou 3.000 mortos em sua cidade de origem, onde havia uma oposição entre sérvios (etnia de seu pai), e bósnios (etnia de sua mãe).

O autor adotou a língua do novo país para escrever seus livros –"Como o Soldado Conserta o Gramofone" (Record, 2009) e "Antes da Festa" (ed. Foz, R$ 42,90, 328 págs.).

"Não conseguia contar a história da guerra na língua da guerra", disse Sasa, em relação à língua bósnia. "O alemão serviu como barreira protetora entre a guerra e eu", explicou.

Já Vecchio defendeu outro caminho. "Poderia escrever em francês, mas quando eu escrevo, me sinto mais protegido em espanhol", disse. "A língua que falo todos os dias é o francês, então o espanhol é uma espécie de língua secreta, ligada à minha infância, à adolescência. É uma maneira instantânea de estar na Argentina."

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Confira a programação completa da Flip 2015.


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