Folha de S. Paulo


Otto prepara álbum 'Ottomatopeia' com rock e melancolia

Otto completará 47 anos no domingo. No mesmo dia, aliás, em que Raul Seixas (1945-1989), o ídolo que morreu aos 44, viraria setentão: 28 de junho. Acha que chegou naquela idade em que "ou você se transforma no que vai ser ou cai do skate".

Porque a essa altura, se ainda não sabe quem é, "você vai comprar um skate", aposta.

O músico pernambucano acredita já ter uma boa ideia formada de si: "Sou pós-punk agora". Em vez de sair rolando sobre uma prancha com rodinhas, corre atrás do tempo perdido na turnê "Otto Recupera", que estreia nesta sexta (26), no Sesc Pinheiros, em São Paulo, e vai até domingo (28).

Dez das 18 canções no repertório ele nunca tocou em shows, apesar de pedidos do público. De "Lágrimas Negras" a "Quem Sabe Deus", elas vêm dos cinco discos que lançou, de 1998 a 2012, mais "Cauboi" –uma "antessala" do próximo álbum, "Ottomatopeia", que gravará no segundo semestre.

Enquanto brinca com o anel da latinha de cerveja já vazia, num estúdio na zona oeste de São Paulo, explica a pegada do futuro disco. Definitivamente mais rock 'n' roll. Mas com melancolia. Também cita ciranda e baião, "que sempre tiveram um lado punk".

Elenca referências de sua "loucura criadora": sertão, ciborgues, centopeias, Quentin Tarantino e "o Araki, aquele japinha meio sexual" –fala do fotógrafo Araki Nobuyoshi, cujo famoso livro "Tokyo Lucky Hole" traz na capa uma mulher de pernas abertas se masturbando, e uma bolinha vermelha nas partes íntimas.

Já Otto não censura nem as lágrimas, avessas ao estereótipo "cabra-macho" de "homem não chora". Como ao cantar os versos "onde que eu posso ir, onde é que eu posso chorar", em "Cauboi". "Prefiro libertar do que aprisionar."

COISINHA DO PAI

O Otto guri, nascido e crescido no agreste pernambucano de Belo Jardim, diz um bocado sobre o Otto quase na esquina do meio século de vida. Ouvia muito Odair José, Ronnie Von, Nelson Gonçalves (todos cantores que regravou).

"Minha infância foi no Nordeste, com meu pai de blusa aberta e capanga [pequena bolsa com alça]. Eu era o 'B.O.' [Boletim de Ocorrência] dele, limpava sua barra."

Otto, cujo avô paterno foi morto por ser amante de mulher casada, vivia no cabaré que o pai frequentava. "Não era pra trepar, era pra beber e dançar. As meninas não abusavam de mim", lembra.

Essa época embasou sua personalidade artística, avalia o ex-percussionista da Nação Zumbi (ainda com Chico Science) e do Mundo Livre S/A.

Otto Maximiliano, que sempre curtiu "o arquétipo do brega", aquela coisa "meio caminhão, mullet e índio de Ray-Ban", fundiu essa bagagem à sua nova persona "pós-punk". Algo entre o goiano Odair José e o ex-Smiths Morrissey –em quem se vê.

"Se eu falasse inglês, seria o cara mais conhecido do mundo. Pelas músicas que poderia fazer, opiniões que poderia dar", empolga-se. "Mas graças a Deus não falo."

Prefere uma versão brasileira, Herbert Richers da vida. "Se você me ver na rua vai pensar: 'Esse cara deve no mínimo gostar de Raul", afirma.

Para Bettina, 10, sua filha com a atriz Alessandra Negrini, Otto não é um pai qualquer. Fica nítido quando vai buscá-la na escola –ele consegue visualizá-la suspirando um "lá vem o pai cantor", entre progenitores de camisa social.

No dia da entrevista, ele usava pulseiras do candomblé, jaqueta, cueca da marca Cavalera à mostra e calça de couro de cintura baixa –o celular com capinha do "Dark Side of the Moon" (Pink Floyd) no bolso.

Otto conta que tem aprendido um tanto com as "chicaninhas" que fazem a cabeça da menina, como a cantora teen Demi Lovato. "Tô me encontrando no 'shuffle' da Bettina. Tem muito Bob Dylan travestido em estrela da Disney", opina. "Na época da Xuxa só faltava pôr um carrossel."

O mundo dá voltas.

OTTO RECUPERA
QUANDO sex. (26) e sáb. (27), às 21h, dom. (28), às 18h
ONDE Sesc Pinheiros, r. Paes Leme, 195, tel. (11) 3095-9400
QUANTO de R$ 15 a R$ 50
CLASSIFICAÇÃO 10 anos


Endereço da página:

Links no texto: