Folha de S. Paulo


Voz sedutora costura trama sobre solitários em brasileiro 'O Gorila'

"O Gorila" foi fruto de um tanto de acaso. Em ocasiões diferentes, o ator Otávio Müller e o cineasta José Eduardo Belmonte bateram na porta do produtor Rodrigo Teixeira para oferecer projetos. Receberam dele, no entanto, o mesmo convite: que tal trabalhar em uma adaptação de um conto de Sérgio Sant'Anna?

Na trama, um ex-dublador meio sem rumo, preso a um papel de destaque, usa sua voz de veludo e promessas pouco veladas –como arrancar calcinhas com os dentes– para seduzir desconhecidas usando o codinome Gorila.

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Otavio Muller e Alessandra Negrini em cena de
Otavio Muller e Alessandra Negrini em cena de "O Gorila".

Belmonte, de filmes como "Alemão" e "Billi Pig", viu ali algo em comum com seus trabalhos anteriores. "Como nos outros filmes, 'O Gorila' fala de uma pessoa tentando sair do isolamento, encontrando e se conectando à realidade", diz.

Müller, por sua vez, fazia há dois anos o seriado humorístico "Tapas e Beijos", da Globo, e buscava algo diferente. "Não me considero só um ator de comédia. Pelo contrário. Busco bons projetos. Queria fazer algo diferente, um filme pequeno, radical."

A dupla unida por Teixeira logo se deu bem. "A primeira vez que li o conto pensei num personagem mais velho. Na hora que ele sugeriu o Otávio achei estranho. Mas ele é um ator incrível que nunca tinha feito um protagonista. A gente fez essa justiça", diz Belmonte.

"Considero 'O Gorila' um divisor de águas na minha carreira. Por mais que seja um filme pequeno, para mim é imenso. É uma hora em que realmente começo a entender a interpretação para cinema, sacou?", afirma Müller.

No longa, o ator se vê rodeado de mulheres. Nas ligações que faz oferecendo seu peito cabeludo para que elas repousem suas cabecinhas, ele se depara com a misteriosa Cíntia (Mariana Ximenes), com a religiosa Lucy (Luiza Mariani) e com a espevitada Magda (Alessandra Negrini), com quem estabelece uma conexão mais profunda.

Magda, vizinha que ele espia pela janela, começa a história terminando um relacionamento e se entrega ao bom papo do Gorila, ajudando-o quando ele se envolve em um caso de suicídio. "São dois solitários que se estranham e se identificam. Ele pede ajuda, ela dá. Eles passam a precisar um do outro", diz Alessandra.

Conhecendo um ao outro, os dois conhecem também um pouco mais sobre si. O filme demorou três anos para ser lançado em circuito comercial. Exibido no Festival do Rio, em 2012, rendeu prêmio a Müller e Alessandra.

Para Belmonte, é complicado explicar a demora. "É como queda de avião, é difícil ter uma única razão. O mercado independente vem caindo, o público está diminuindo e tem muita gente fazendo. Dificulta um pouco achar distribuidoras que queiram apostar num thriller. É um filme de arte", diz.

A equipe acabou também por se dedicar a outros projetos, deixando o "Gorila" um pouco de lado. No fim, o mesmo acaso que deu início ao filme também terminou por atrasar sua estreia, diz Belmonte. "É o imponderável."


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