Folha de S. Paulo


Distante do caso, Procure Saber afirma confiar no julgamento da relatora

O Procure Saber pulou fora do barco, mas o debate sobre as biografias não autorizadas está longe de ir a pique.

Liderada pela produtora Paula Lavigne, ex-mulher de Caetano Veloso, a associação de artistas deseja boa sorte no tribunal. "Confiamos na ministra Carmen Lúcia, sabendo que ela será justa em sua avaliação ao levar em consideração os dois gigantes de nossa Constituição: liberdade de expressão e direito de privacidade", diz comunicado divulgado no Facebook na última quinta (4) –a nota ganhou três curtidas na rede social.

Dois dias antes, Lavigne disse à Folha, por e-mail: "Estamos fora do assunto desde a saída de RC da APS [Associação Procure Saber]". Não respondeu a um pedido de entrevista sobre a posição da entidade. Procurada, Flora Gil, mulher de Gilberto e integrante da APS, disse que nada tem a dizer sobre o tema.

Editoria de Arte/Folhapress

RC é Roberto Carlos, ex-integrante que procurou não saber mais do front em novembro de 2013. Seu empresário, Dody Sirena, enviou um e-mail para os chamados "notáveis" do grupo (Caetano, Gil, Chico Buarque, Djavan, Erasmo Carlos e Milton Nascimento).

Dizia: "Acredito que podemos nos ver como uma seleção na qual os grandes craques se reúnem para defender o país e depois voltam para os seus times. [...] A partir de agora, fiquem à vontade com o andamento do Procure Saber sem a presença direta do Roberto".

Dody diz à Folha que, à época, Roberto teve "zero problema" com os artistas, mas se distanciou por entender que houve "uma tremenda distorção" do que o cantor defende de fato, "por questão do comando". Refere-se a Lavigne.

No fim de 2013, auge do racha, Caetano escreveu artigo no jornal "O Globo" criticando Roberto. Disse que sempre se posicionou "contra a exigência de aprovação prévia para biografias" e que membros da APS viraram alvo. "Apanhamos muito da mídia e das redes, ele vem de Rei."

Fora do Procure Saber, Roberto fundou o Instituto Amigo, que será "amicus curiae" no julgamento na mais alta corte do país –poderá se manifestar como causa interessada no processo. Não o fará "in loco" –será representado pelo advogado Antonio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, famoso por clientes que vão de Carolina Dieckmann (caso sobre fotos íntimas vazadas na internet) a Duda Mendonça (inocentado no mensalão).

Para Dody, muitos desconhecem a posição de Roberto. Segundo o advogado, ele não é a favor do veto prévio, mas que biografias saiam de circulação se ferirem "o bom senso" das "regras de privacidade". É o que teria acontecido em 2007 com "Roberto Carlos em Detalhes", de Paulo Cesar de Araújo. O livro foi recolhido após audiência de conciliação com a editora Planeta na qual o juiz deu um CD dele, autografado, para RC.

Dody usa um exemplo drástico: "Nos EUA, um condenado por estupro não pode escrever sobre o seu crime. A vítima sofreria duas vezes".

Outro ponto levantado por Dody: a comercialização das obras. "O biógrafo e a editora não podem se apropriar comercialmente de uma história que pertence à celebridade. O livro vira série, filme, negócio."

Compara o caso ao "direito autoral pago ao Ecad" (Escritório Central de Arrecadação e Distribuição), quando uma canção é reproduzida –quem escreve sobre alguém, defende ele, também deveria ter de dividir o lucro.

Dody traz novo tema à baila, falando "como empresário", e não por Roberto: questiona se o biógrafo fatura em cima de uma marca registrada no INPI (Instituto Nacional da Propriedade Industrial), órgão do governo para marcas e patentes. Lembra que patrocinadores pagam para explorar nome e imagem de RC e de músicas como "Detalhes" (parte do nome da biografia escrita por Paulo Cesar).

Para Gustavo Binenbojm, da Anel, associação de editores a favor das biografias não autorizadas, há "variados pretextos, mas a essência é a mesma: controlar o que os outros podem dizer, para controlar como os outros devem pensar".


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