Folha de S. Paulo


CRÍTICA

'Entre Abelhas' é muito mais que veículo para Porchat

"Entre Abelhas", do diretor Ian SBF, é anunciado como uma incursão do comediante Fábio Porchat em papel dramático.

Vez ou outra a ideia é seguida por algum ator de comédia, como se para demonstrar talento fosse necessária a mudança de gênero.

Porchat interpreta Bruno, um rapaz que acaba de se separar da esposa (Giovanna Lancellotti). Num dia qualquer, ele passa a sofrer de um problema inusitado: as pessoas, aos poucos, começam a desaparecer para ele.

Bruno Leão/Divulgação
Fábio Porchat em cena do longa 'Entre Abelhas'
Fábio Porchat em cena do longa 'Entre Abelhas'

Tudo começa quando ele esbarra em alguém que não viu na saída do metrô. Daí em diante, o número de pessoas que não vê cresce dia a dia.
Ele ainda é capaz, num primeiro momento, de ver a mãe (Irene Ravache), o amigo machista e sexista Davi (Marcos Veras), o psiquiatra (Marcelo Valle), a ex-mulher. Mas é incapaz de interagir com alguns estranhos, incluindo um taxista, ou mesmo alguns amigos do trabalho.

Situações cada vez mais bizarras se sucedem, sobretudo quando sua mãe, a única que sabe do problema, tenta ajudá-lo de todas as formas. Ela chega até a contratar um atendente de uma lanchonete (não visto por Bruno) para fazer testes.

Ou seja, não estamos distantes da comédia, ainda que essa comédia seja muito mais inteligente que coisas do tipo "Meu Passado me Condena" (2013) ou a maior parte dos vídeos do Porta dos Fundos (onde despontaram Porchat e o diretor Ian SBF).

Também não estamos longe do drama, uma vez que o sofrimento do protagonista começa a tomar conta, aos poucos, da narrativa. E nós passamos a ver somente quem ele pode ver. Convém não adiantar aqui, mas haverá ainda uma bela mudança de registro.

Mas, afinal, o que está por trás do problema de Bruno? Uma misantropia inconsciente? Um sentimento de inadequação na sociedade? Um distúrbio cerebral?

ENIGMAS

Por que precisamos saber, afinal? Muito se perde tentando encaixar as coisas, amarrando tudo para acariciar o público com respostas fáceis. Enigmas, por vezes, são necessários para alimentar a imaginação dos espectadores. E é louvável que um filme de ambição comercial provoque mais perguntas do que respostas.

O certo é que em momento algum o filme fica enfadonho. A curiosidade vem acompanhada sempre de um domínio narrativo que tem se tornado raro.

E quando, após o riso, surge repentinamente o travo na garganta, "Entre Abelhas" se mostra muito mais do que um veículo para Fábio Porchat.

É na verdade um dos raros filmes brasileiros recentes que aliam apelo comercial com inteligência.

Entre Abelhas
DIREÇÃO: IAN SBF
ELENCO: FÁBIO PORCHAT, IRENE RAVACHE, MARCOS VERAS
PRODUÇÃO: BRASIL, 2015, 14 ANOS
QUANDO: ESTREIA NESTA QUINTA (30)


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