Folha de S. Paulo


Orquestra Jovem do Estado de São Paulo se apresenta nos EUA

Renan Gonçalves, 20 anos, nunca havia viajado para fora do país. Mas nesta quinta (19) o violinista embarcou com a Orquestra Jovem do Estado de São Paulo para os Estados Unidos, onde os 90 músicos de 13 a 26 anos se apresentarão pela primeira vez.

Neste domingo (22), a orquestra regida por Cláudio Cruz, que por 20 anos foi spalla da Osesp (Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo) toca no Concert Hall, do The Kennedy Center, em Washington, como uma das atrações do festival Iberian Suite: Global Arts Remix, que terá também atrações de dança, teatro, artes visuais, literatura, desenho e moda.

Será a primeira vez que uma orquestra jovem brasileira toca na sala, assim como acontecerá no Alice Tully Hall, no Lincoln Center, onde o grupo faz concerto a convite da Juilliard School, prestigiada escola por onde já passaram, por exemplo, o violinista israelense Itzhak Perlman e o violoncelista francês de ascendência chinesa Yo-Yo Ma.

Adriana Elias/Divulgação
Orquestra Jovem do Estado de São Paulo no concerto de 7 de março de 2015 na Sala São Paulo
Orquestra Jovem do Estado de São Paulo no concerto de 7 de março de 2015 na Sala São Paulo

"Estou ansioso. Todo mundo gostaria de tocar em salas como essas", diz Gonçalves, que é o spalla. "Mas acho que estamos preparados."

ASSOMBRO

O público que encheu a Sala São Paulo no último dia 7, na abertura da temporada da "Estadualzinha", como é carinhosamente chamada, demonstrou ter aprovado a forma como executaram o mesmo programa a ser exibido em Nova York.

O pianista malaio Tengku Irfan, 16, solista no concerto de Beethoven, teve de voltar ao palco cinco vezes porque o público não parava de aplaudi-lo. Antes, houve até uma quebra de "protocolo" da plateia, que não se conteve em bater palmas mesmo entre um movimento e outro.

Todos queriam bis, mas Irfan disse, depois, à Folha, que não tocou mais porque não queria estragar os sentimentos que a obra de Beethoven havia deixado na plateia. O jovem é estudante da Juilliard e tocará com a orquestra em Nova York. "Ele é um assombro. Não é um músico, é música", diz o maestro Cláudio Cruz.

Durante a execução de "Choros nº 6" era possível ver na plateia gente balançando a cabeça no ritmo e até trocando olhares de surpresa por perceberem, ali no palco, a presença de um tamborim. A primeira peça executada foi de outro brasileiro: A "Abertura Concertante" de Camargo Guarnieri (1907-1993).

Em Washington, além de "Choros nº 6", serão tocados a "Suíte Sinfônica", de Tom Jobim (1927-1994) e "A Floresta do Amazonas", de Villa-Lobos, com participação da soprano americana Harolyn Blackwell.

NOVO OLHAR

Desde que a organização social Santa Marcelina implantou um novo programa de trabalho na orquestra, em 2012, os jovens bolsistas já viajaram para fora do país três vezes: para a Alemanha (em 2012 e 2013), França e Holanda (2014).

Por meio desse trabalho, sete integrantes foram estudar na Europa: quatro na Alemanha, um no Reino Unido, um na França e outro na Holanda.

Integrante do grupo que foi para os EUA, a violinista Jamile Costa Destro, 15, até vem sendo chamada de "ricona" por colegas do colégio no Itaim Paulista (zona leste) onde cursa o primeiro ano do ensino médio, por causa da turnê. "Nada a ver, nem vou pagar a viagem", diz.

Será sua segunda vez nos EUA, para onde viajou no ano passado para uma imersão de estudos de cerca de dez dias na Juilliard School. "Evoluí bastante, recebi dicas que nem imaginava e ainda aprendi o sentido de união, porque entre os brasileiros que foram, um ajudava o outro."

Morador de Perus (zona norte) e primeiro colocado no vestibular da Unesp (Universidade Estadual Paulista) para seu instrumento, o violoncelista Guilherme Afonso de Moraes Silva, 17, começou a estudar alemão motivado pela experiência que teve nas viagens com a orquestra para a Alemanha, França e Holanda.

"Acho que tudo deve ser mais acelerado nos EUA, vai ser um choque cultural", aposta Silva, que está ansioso para conhecer o Central Park e também o Carnegie Hall, onde sonha em um dia talvez se apresentar.

"Da primeira vez que fomos para a Alemanha, dos 90, só pouco mais de 20 tinham passaporte e uns 50 nunca tinham entrado num avião", diz o diretor artístico e pedagógico da Santa Marcelina, Paulo Zuben.

O diretor sênior da Juilliard School, Christopher Mossey, diz à Folha que a escolha da Orquestra Jovem para tocar no Lincoln Center "foi uma escolha natural depois de tantos anos de trabalho". A parceria da escola vem desde 2010.

Já a vice-presidente de programação internacional do The Kennedy Center, Alicia Adams, conta que estão "entusiasmados com a Orquestra Jovem do Estado, composta por jovens artistas muito talentosos que executam a música de dois dos compositores brasileiros mais conceituados e populares, Tom Jobim e Villa-Lobos".

GESTÃO

Nessa gestão, a orquestra pulou de 60 para 90 músicos e o valor da bolsa subiu de R$ 460 para R$ 1.750. As vagas são disputadas em processos seletivos e quem entre na orquestra automaticamente participa da Emesp (Escola de Música do Estado de São Paulo - Tom Jobim).

Os ensaios para concertos, antes feitos duas vezes por semana, passaram a ocorrer de segunda a sexta, durante duas semanas consecutivas. "A Osesp faz uma semana; nós, duas. É assim que as principais orquestras do mundo fazem", diz Zuben.

A intenção, porém, não é que esses jovens migrem precocemente para as orquestras profissionais, mas aproveitem o estudo por mais tempo e deem continuidade a essa preparação nas universidades.

"O diferencial não é o repertório que tocamos, mas o projeto pedagógico. Ali, os bolsistas têm aulas sobre o compositor, o período, e trabalham o repertório orquestral com os professores", diz Cruz.

"Há um certo estigma de que a música clássica é das elites, porque ela era apropriada por uma comunidade pequena. A questão é dar oportunidade para as pessoas. As barreiras são mais sociais que estéticas", diz Zuben.

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