Folha de S. Paulo


Peça em tribunal é cancelada, e produção alega censura

O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP), com aval de seu presidente, José Renato Nalini, cancelou nesta semana oito apresentações da peça "Dissecar uma Nevasca" que seriam apresentadas no hall de entrada do Palácio da Justiça, localizado na região da Sé, no centro de São Paulo.

A produção da montagem alega censura a cenas de nudez e a diálogos contendo palavrões.

Segundo André Canto, produtor do espetáculo, a temporada estava prevista para ser realizada entre os dias 7 e 29 de março. O acordo não havia sido firmado por escrito, apenas verbalmente. "Estávamos em diálogo desde outubro do ano passado e, para dar o OK final, nos foi exigida uma proposta de texto com cortes de cenas de nudez e de diálogos contendo palavrões", diz Canto.

O espetáculo tem texto da autora sueca Sara Stridsberg, direção da também sueca Bim de Verdier e já passou por uma temporada no Sesc Belenzinho, entre janeiro e fevereiro. A trama se inspira na vida da rainha sueca Cristina (1626-1689).

Um e-mail trocado entre a produção da peça e o escrevente técnico judiciário Paulo Rovina Capovilla, do TJ-SP, registra questionamentos da produção relativos a pedido de corte.

Lenise Pinheiro/Folhapress
A atriz Nicole Cordery em 'Dissecar uma Nevasca' durante a temporada no Sesc Belenzinho
A atriz Nicole Cordery em 'Dissecar uma Nevasca' durante a temporada no Sesc Belenzinho

"O incômodo está no seio aparente? Quando a personagem passa a tinta sobre os seios, ainda é considerado nudez?", pergunta Canto.

Em sua resposta, Capovilla diz: "[...] Compreendo a insistência quanto à solução das questões que foram apresentadas, mas, como foram levantadas de forma generalizada, eu não tenho como te precisar uma resposta". No e-mail, é sugerida uma reunião com a presidência "para que as dúvidas possam ser dirimidas".

"Quando, poucos dias antes da reestreia prevista, recebemos a notícia de que a temporada tinha como condição cortes de palavras específicas do texto e extração ou mudanças, ficamos chocados", diz a diretora do espetáculo.

"As modificações neste caso perturbariam o significado da obra, sua dramaturgia, e seriam um total desrespeito com sua autora", continua.

"Um espetáculo pode ser modificado depois da estreia, mas essas modificações são feitas pelos artistas com critérios artísticos, jamais podem ser feitas sob pressão de outros."

Em ofício à diretora, Nalini dá outra explicação à recusa, alegando que os horários de apresentação e a duração da peça eram incompatíveis com o espaço. No texto, diz que eventos apresentados pelo Projeto Arte e Cultura no TJSP "são de menor envergadura e acontecem sempre no horário do almoço ou no final da tarde de um dia de labor, normalmente com duração máxima de 60 minutos."

A assessoria de imprensa do tribunal diz que Nalini não solicitou cortes na peça em razão de cenas de nudez.

"Se a solicitação foi feita, o foi por pessoas encarregadas de trazer os espetáculos para o projeto Arte e Cultura no TJ, que, inadvertidamente, podem ter imaginado que o espetáculo, mais curto e sem cenas de nudez, tivesse condições de ser apresentado em dias de semana, tal qual tem acontecido em todas as apresentações do Arte e Cultura no TJ."


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