Folha de S. Paulo


Pequenas editoras apostam em livros de dramaturgia brasileira

É um nicho pequeno e incipiente no Brasil, mas a publicação de dramaturgias –textos de peças teatrais editados em livro– tem ganhando força com lançamentos de pequenas editoras, que tentam cavar um espaço para o gênero no mercado editorial.

Elas procuram ir além dos textos clássicos, como Tchékhov, Tennessee Williams e Nelson Rodrigues, e apostar em autores que têm se destacado na produção contemporânea de teatro.

Criada em 2005, a Giostri começou a investir na área em 2008 e hoje conta com 150 autores em seu catálogo, que abrange nomes de Hugo Possolo a Maitê Proença. Para a próxima semana, a editora tem agendado os lançamentos de "Cinco Peças de Dionisio Neto", "Betty Milan - Teatro Lírico e Teatro Dramático" e "Não Conte a Ninguém/ Coração Dark Room", de Ricardo Corrêa.

No ano passado, 30% dos 240 títulos lançados pela casa foram peças teatrais, afirma o fundador, Alex Giostri. Mas a saída dos livros (com tiragens entre 1.000 e 2.000 exemplares) ainda é pequena, com sobras de mais de 50%.

Giostri diz que as vendas de obras mais comerciais permite à editora publicar "o que nos interessa, que é a catalogação do teatro brasileiro".

Editoria de Arte/Folhapress

Para Isabel Diegues, editora-chefe da Cobogó, as publicações mostram as nuances da dramaturgia: comentários e adaptações que nem sempre são vistos em cena. "Muitas peças que publicamos foram escritas em processo de ensaio, outras foram feitas antes e a encenação é muito diferente do texto original", conta ela, que edita nomes como Jô Bilac, Felipe Rocha e Grace Passô.

No caso de "Cine Monstro" (2013), adaptação de Enrique Diaz para a obra do canadense Daniel MacIvor, foi feita uma edição bilíngue com o texto original, em inglês, e a versão em português de Diaz, que fez mudanças na narrativa.

Os livros de teatro da Cobogó têm tiragem média de 2.000 cópias e são os únicos da editora, afirma Diegues, a terem uma segunda edição. Mas ela considera pequena a saída. "Se o teatro em si tem um problema de falta de público, imagine os livros de teatro."

LEITOR ESPECIALIZADO

Outra dificuldade é expandir as vendas para leitores não especializados. "As pessoas acreditam que a peça é para ser assistida, não lida", diz Mary Lou Paris, diretora da Terceiro Nome.

"A cena teatral está muito rica", diz Milton Ohata, editor da área de teatro da Cosac Naify. "Mas, ao contrário da Europa e dos EUA, onde há uma tradição consolidada, aqui é raro que um texto teatral sobreviva em livro."

"Não há muitas editoras que investem em livros de teatro, justamente por ser este um nicho de pouca representatividade no mercado editorial", explica Danilo Santos de Miranda, diretor do Sesc em São Paulo. A editora da instituição destina 10% do seu catálogo a títulos relacionados a teatro, alguns cujos projetos fazem parte da programação de unidades do Sesc.

Com frequência, é no público especializado que os artistas pensam ao editar seus trabalhos. É um modo de tornar os textos acessíveis a quem possa produzi-los. O autor Dionisio Neto, por exemplo, foi convidado a mostrar sua obra no grupo alemão Acker Stadt Palast depois de a trupe saber da publicação de seus textos.

Outro objetivo é que escolas adotem os livros. Isabel Diegues lembra que a maior saída da editora canadense da peça "Incêndios", de Wajdi Mouawad (depois publicada em português pela Cobogó), é para escolas do Canadá. "Porque é uma literatura divertida e fácil de dar em sala de aula."

No Brasil, são poucas, mas "algumas escolas têm visto o teatro como uma maneira de aplicar a pedagogia", relata o fundador da Giostri, que começou no ano passado uma linha de dramaturgia infantil.

Para a livreira Gisele Caterina, que há cinco meses criou o site Livraria do Teatro, no qual vende mais de mil títulos na área, a pouca leitura se deve à falta de divulgação e de buscar o leitor no próprio teatro. "Fora do Brasil, os teatros têm publicações caprichadas."

Foi a estratégia da Giostri para acelerar as vendas. Há cinco anos, a editora mantém estandes em teatros. São 11 em São Paulo, um no Rio e um em Araras (SP). E a empresa planeja abrir duas novas livrarias em centros culturais de São Paulo e quatro em teatros da Bahia.

A produção da peça "Insubmissas", em cartaz desde janeiro em São Paulo, foi por um caminho semelhante para aproximar o espectador do texto do espetáculo, escrito por Oswaldo Mendes. A obra completa vem encartada no programa que é distribuído ao público no início das sessões.

"É uma maneira de as pessoas, mais tarde, resgatarem a peça de forma afetiva", conta Carlos Palma, diretor da montagem. O encenador afirma que houve grande demanda do público pelo encarte e foram feitas até agora duas edições do programa, totalizando 2.000 cópias.

Na visão de Dionisio, o leitor precisa ter uma relação diferente com o livro de dramaturgia, um texto escrito para ser falado. "Minha dica é ler em voz alta", comenta.

Tanto que as editoras têm se preocupado com o formato do livro dramatúrgico: ele tem que ser pequeno, fácil de manusear e ter letras grandes, para ser usado em leituras e ensaios, diz Isabel Diegues.

Pensando nisso, a Cosac Naify decidiu reformular o projeto gráfico de suas edições teatrais. "Uma das nossas discussões é que nossos livros de teatro eram meio complicados de manusear", diz Ohata. "Para um ator, esse formato menor é muito mais prático."


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