Folha de S. Paulo


Tomie terá mostra de inéditos em abril

Nos últimos meses de vida, Tomie Ohtake pintou uma série de telas brancas, mas voltou atrás em algumas delas, cobrindo as composições com tons de vermelho vivo.

"Ela se assustou quando viu tudo branco", lembra o crítico Miguel Chaia, amigo da artista, que passou as últimas horas ao lado de Tomie, morta na quinta (12), aos 101 anos. "No hospital, ela dizia que tinha que sair logo para voltar a pintar e voltar para a cor."

Essas telas, que Chaia vê como um "testamento" deixado por Tomie, estarão numa mostra em homenagem à artista marcada para abril no Instituto Tomie Ohtake. Em Londres, oito pinturas dos anos 1970 e 1980 da artista serão expostas na feira Frieze Masters, em outubro, evento que já estava marcado antes de sua morte.

Eduardo Knapp/Folhapress
Tomie Ohtake em sua casa no bairro Campo Belo, em São Paulo
Tomie Ohtake em sua casa no bairro Campo Belo, em São Paulo

No velório da artista, realizado nesta sexta no centro cultural que leva seu nome, amigos e parentes de Tomie contaram que ela seguiu trabalhando até dezembro do ano passado, quando começou a adoecer e ficou fraca demais para continuar pintando.

"Quando ela não conseguia mais pintar, começou a dizer que queria morrer. A vida para ela era a obra dela", dizia Nara Roesler, galerista da artista, no velório. "Ela disse que as últimas obras foram as mais difíceis que fez na vida."

Uma parte dessa última leva de telas, quase todas monocromáticas, foi exposta em outubro passado na filial carioca da galeria Nara Roesler.

Mas desde que começou a ter dificuldades para respirar e a sofrer com uma pneumonia, Tomie dizia aos filhos e à nora, Marcy Junqueira, mulher de Ricardo Ohtake, que já tinha "chegado a hora".

"Ela estava bem até os cem anos, mas quando fez 101, em novembro passado, cismou que já era demais", lembra Marcy. "Não tinha ansiedade nem culpa na vida dela. Ela estava calma, zen. Não tinha medo de morrer. Era um exemplo de paz."

Tomie chegou ao fim da vida, aliás, em paz com os rumos de sua obra. Ela dizia que já tinha feito o suficiente, que deixara um legado, embora quisesse continuar pintando.

Nas primeiras horas de seu velório, em São Paulo, cerca de mil pessoas passaram pelo Instituto Tomie Ohtake para se despedir da artista. Sentado diante do caixão, estava seu neto, o arquiteto Rodrigo Ohtake, ao lado da mulher.

O corpo de Tomie seria cremado ontem à tarde, em cerimônia reservada à família, mas o meio artístico foi em peso ao velório. Estiveram lá artistas como Regina Silveira, Emanoel Araújo, José Resende, Jac Leirner e Carmela Gross e críticos como Aracy Amaral, Paulo Venâncio Filho e Fábio Magalhães.

Também foram as galeristas Nara Roesler e Raquel Arnaud e colecionadores, como Pedro Barbosa e José Olympio Pereira, um dos maiores patronos da Pinacoteca do Estado.

Danilo Santos de Miranda, diretor do Sesc em São Paulo, esteve no velório e dizia que, além da obra de Tomie, o trabalho dos filhos, Ruy e Ricardo, e dos netos, Rodrigo e Elisa, que é atriz e bailarina, era uma parte importante do legado da artista.

Nara Roesler, que levou o time de sua galeria ao velório, contou também que Tomie vinha dizendo que, depois das telas em branco, faria uma exposição "cheia de cor".


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