Folha de S. Paulo


Cartunistas lamentam a morte de Georges Wolinski, vítima de atentado

Cartunistas lamentam a morte de Georges Wolinski, 80, uma das vítimas do atentado ao jornal satírico francês "Charlie Hebdo" nesta quarta (7), e considerado um dos maiores nomes do gênero no país.

Nascido na Tunísia em 1934, Wolinski mudou-se para a França aos 13 anos. Começou a desenhar para o jornal satírico "Hara-Kiri" durante os anos 1960. Durante os eventos de maio de 1968, fundou o jornal "L'Enragé", juntamente com o caricaturista Siné —dando viés político a seus cartuns.

No atentado, ao menos dez jornalistas e dois policiais foram mortos na sede da publicação, em Paris.

Reprodução/Instagram/porliniers
Cartum postado por Liniers em homenagem a Georges Wolinski, no Instagram
Cartum postado por Liniers em homenagem ao jornal 'Charlie Hebdo', no Instagram

De acordo com a polícia, três homens fizeram disparos e depois fugiram em um carro dirigido por um quarto elemento do grupo.

O jornal já sofreu ataques por publicar caricaturas de líderes muçulmanos e do profeta Maomé. Em 2011, a redação foi alvo de um incêndio criminoso após ter publicado uma série de caricaturas sobre Maomé.

Cartunistas comentam a morte de Georges Wolinski

Ziraldo, à Folha
Você repara uma coisa: de todos os atentados que a gente tem notícia, contra mulheres, crianças, aquelas decapitações, o que mais chocou o mundo foi esse de Paris agora. Porque foi um atentado contra a liberdade, estão tentando acabar com a nossa liberdade de pensar.

Eu acho que esse atentado vai ser um marco, que a luta contra o terror do ocidente vai ter um antes e um depois dele.

A única solução é a guerra, mas a guerra está perdida, porque eles são como "shmoos" [personagem de quadrinhos criada pelo cartunista Al Capp]: você mata um e ele vira dois, depois quatro e assim por diante. O terrorista é imortal.

O Wolinski, apesar de ter coragem de comprar essa luta, era muito tranquilo no trato.Nós somos da mesma geração, e como ele mesmo dizia, somos uma comunidade internacional. Eu sempre o via quando ia para Paris.

Francês não chama nem a tia para almoçar em casa e eu ia, almoçava na casa dele. Ele dizia: "Dentro de casa sou burguesão, mas lá fora a luta é outra."

Maurício de Sousa, à Folha

A liberdade de expressão está de luto pelo atentado à revista satírica Charlie Hebdo, em Paris. Doze pessoas morreram na ação entre as quais três desenhistas. Um deles Wolinski, considerado um dos maiores cartunistas do mundo, que com seu traço descontraído e humor irreverente, influenciou um bom número de artistas brasileiros.

Ele os fazia rir às lágrimas. Como muitos dos seus personagens. Nossas homenagens às vítimas da intolerância.

Laerte, à Folha
Isso é um gesto de uma agressividade e de uma violência absurdas. Eu continuo a favor da liberdade de expressão. Continuo achando que deve existir, mas que existe num mundo que também não pode ignorar um contexto de maioria religiosa e mexer com os dogmas daquela religião impunemente.

É uma polêmica bastante ambígua, cheia de lados. Faço questão de levar todos esses lados em conta.

Não acho que deve haver liberdade de expressão pra quem tá a fim de fomentar o ódio, o machismo, a homofobia e o racismo. Mas eu também sou a favor da liberdade de expressão –o humor sem liberdade de expressão morre.

Não vi as charges que motivaram os ataques –não tenho como opinar sobre isso. Não posso dizer que foram eles [os chargistas] que provocaram o ataque. Tem que levar em conta as tensões crescentes no Oriente Médio, a direita ultracrescente na Europa.

Adão, à Folha
"Hoje foi um dia difícil para eu me mover. Tenho grandes influências, como Angeli, Henfil, Glauco, mas o Wolinski é grande parte de tudo o que eu sou.

Conheci o trabalho dele em Porto Alegre, com uns 22 anos, e fui morar na França por causa dele. Acho que todo mundo da minha geração tem influência dele. Uma vez comentaram comigo que o Wolinski é um escritor que desenha, e é bem isso mesmo.

Hoje fui vendo as notícias e, quando vi o nome dele, fiquei mais paralisado. O mundo inteiro está paralisado. Foi uma facada em todo desenhista, todo jornalista, e as facadas em toda a humanidade estão cada vez ficando piores. Cada um de nós morreu um pouco hoje."

Allan Sieber, à Folha
"Para mim, é como se tivessem dado um tiro na cabeça de um Jaguar, um Drummond. É muita brutalidade. A gente vive num mundo brutal, mas tem vezes que a gente acha que está escolado e as coisas te surpreendem. Wolinski foi uma referência pra mim.

Conheci o trabalho dele numa coletânea de quadrinhos publicada nos anos 1980 pela L&PM. Quando pus os olhos naquilo vi que o humor podia ser uma coisa ao mesmo tempo escrota e ultrasofisticada. O desenho dele também tinha essa coisa de variar entre o superchutado e rápido e o superrebuscado, com sombras, bem desenhado.

O humor dele, dessa linha da "Charlie Hebdo", tudo pelo humor, sem concessões, sem dúvida me inspirou muito."

Arnaldo Branco, à Folha
"Ele era um alento pra quem desenha mal. Embora desenhasse bem, ele subproduzia o traço dele de propósito, fazia um desenho meio tosco para ressaltar os aspectos cômicos da piada. É impressionante imaginar que ele morreu nas mãos de alguém que ele incomodou, e incomodou gente à beça, os comunistas, os direitistas, era uma metralhadora giratória.

Ele morrer dessa maneira parece até um troféu de guerra para um cara que sempre foi tão combativo. Acho importante ressaltar o absurdo da situação. Não sei que causa é essa, que verdade é essa, que precisa se vingar de uma piada. Que causa tão fraca é essa que usa o assassinato contra uma piada."

Eloar Guazzelli, à Folha
"Ele foi uma referência pra todo mundo, em maior ou menor grau. Foi da formação mesmo, com aquele humor cáustico, anárquico. O que posso ressaltar é que quem lucrou com a morte dele foram não só seus piores inimigos, não só quem o matou, mas também a extrema direita francesa, que ele combatia como o autor libertário que era.

É uma guerra em que a vítima alimenta seus inimigos. Quem lucrou diretamente com esse atentado foi Le Pen. O Wolinski era inimigo dessa gente. O exemplo que fica para nós é o de tentar herdar essa coragem dele, de nunca se dobrar, honrar esse caráter liberário dele.

Fico extremamente triste porque só quem vai fazer um cavalo de batalha dessa tragédia são os inimigos dele."

André Dahmer, à Folha
"Dia triste para os que acreditam que a inteligência pode ser maior do que a violência. Wolinski e três dos melhores cartunistas da França estão mortos. Pessoas progressistas, vozes que falavam contra os desmandos da direita francesa inclusive. Wolinski é uma perda irreparável.

Um cara que influenciou três gerações de desenhistas. Talvez o maior cartunista em atividade. Lamentável e incompreensível."

Adolpho Queiroz, Presidente do Conselho Consultivo do Salão Internacional de humor de Piracicaba, em nota

"Em nome do Conselho Consultivo do Salão Internacional de Humor de Piracicaba, venho manifestar o nosso mais veemente repúdio ao atentado terrorista ocorrido hoje em Paris, contra o semanário "Charlie Hebdo", que resultou em 12 mortes e outros feridos graves. A revista, que tradicionalmente ironizava a intolerância política islamita, foi covardemente assaltada e fuzilada.

O humor gráfico tem como traço principal, historicamente no mundo todo, a sua não subserviência contra quaisquer tipos de ditaduras, sejam políticas, militares ou religiosas.

Lançamos por ocasião dos 40 anos do Salão Internacional de Humor de Piracicaba, o livro "Balas não matam ideias", em coautoria com a acadêmica do Curso de Publicidade, Leticia Ciasi, infelizmente, nunca o título daquele livro esteve tão atual.

Que as autoridades francesas e a comunidade política e artística internacional, manifestem seu profundo repúdio contra um atentado à livre manifestação do pensamento, uma das maiores conquistas da sociedade contemporânea.

Manifestei, em nosso nome, ao presidente da FECO, Federação Internacional dos Cartunistas, Francisco Puñal Suárez, o nosso pesar pelos falecidos, feridos, extensivos aos seus familiares e amigos."

Caco Galhardo, à Folha
"Wolinski era um dos gigantes do cartum, um dos caras mais legais. É uma perda absurda para o mundo dos quadrinhos —ele era um dos maiores.

Mais do que quadrinista, era um cartunista assim nato, de mão cheia. Eu conheci pouco o Wolinski, mas ele era sempre uma influência, porque era o mais despirocado, o mais livre dos cartuns. Ele colocava essa coisa da liberdade dele nos seus cartuns.

É uma coisa horrorosa, um atentado por causa de charge, de cartum. É uma violência sem precedentes, eu não me lembro de haver algo desta forma antes."

Festival de Angôuleme, principal mostra de quadrinhos da França, em nota
"O desenho, de todos os tempos, foi para o homem o meio de exprimir: para dizer, partilhar, testemunhar, protestar, dialogar, questionar, significar, reunir. Para portar as ideias. As tirinhas vieram enriquecer esse modo de expressão original —que precede a escrita.

Às vezes no humor, às vezes com gravidade.

Hoje, na sede do "Charlie Hebdo", homens foram mortos por serem desenhistas, espíritos livres. Alguns entre eles nos eram bastante familiares —em particular Georges Wolinski, premiado no festival em 2005. Nós éramos todos próximos, porque eles tinham o mesmo talento de saber dizer tudo em traços quaisquer, para nos dar o que pensar.

E porque é nossa vocação, graça aos autores de quadrinhos que nos mostram a via, nós continuaremos a pensar, com eles e por nós mesmos. De duvidar antes de agir, para sempre agir bem. E com uma certeza: o desenho, ele, é eterno, e, dentro de nossos corações, os desenhistas desaparecidos o serão também."

Fernando Gonsales, à Folha
"Posso dizer que fico muito chateado, porque ele era um puta cartunista, que influenciou muita gente no brasil, direta ou indiretamente.

Para mim foi indiretamente, através de outras pessoas, porque [as tiras] chegavam ao Brasil em publicações mais alternativas, eram vistas por gente mais antenada —o que não era o meu caso."

Rafael Campos Rocha, no Facebook
"WOLINSKI foi acusado de falocrata, masculi e todas essas merdas, porque era um LIBERTÁRIO. Quem matou foi mais um desses patrulheiros filhos da puta, para o qual a causa (seja religiosa, política ou de gênero) não serve para LIBERTAR, mas sim para COIBIR, CASTRAR e DESTRUIR, além de, é claro, de manter a sociedade de exploração, que vocês, moralistas de merda, precisam para continuar transformando a vida dos outros em um inferno."


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