Folha de S. Paulo


Crítica foi guiada por viés de preconceito e de combate ao teatro musical do Brasil

Por acreditar que a natureza do pensamento crítico é retroalimentar o debate, dialogo com a resenha de Gustavo Fioratti publicada na "Ilustrada" no dia 12 deste mês sobre a peça "Eu Vou Tirar Você Deste Lugar "" As Canções de Odair José", dirigida por mim.

No texto, há posicionamento político de aversão à "onda" do teatro musical brasileiro que se inspira em repertórios de ícones da MPB: "esse modismo em dose cavalar imposto ao teatro pela indústria cultural" ou "nesse lugar estranho chamado falta de assunto".

O ataque não é novidade. O teatro de revista no Brasil sofreu, em sua história, uma luta ferrenha de intelectuais que se consideravam maiores à sua estética e ao discurso popular, nas velhas dicotomias "arte superior" x "arte popular", "drama" x "comédia", "Brecht" x "Stanislavski".

Lenise Pinheiro/Folhapress
Atores em cena de 'Eu Vou Tirar Você Deste Lugar'
Atores em cena de 'Eu Vou Tirar Você Deste Lugar'

Sou adepto da crítica dialética que associa o espetáculo ao contexto histórico em que está inserido.

CONTRAPONTO

No entanto, a reflexão, nesse caso, sustenta-se em viés preconceituoso e de combate a um território criativo no qual o teatro musical brasileiro tem encontrado forças para existir em contraponto aos milionários musicais de matrizes criativas importadas, que têm um importante papel na geração de empregos, na qualificação profissional, no fortalecimento no circuito de entretenimento, mas que não são genuinamente brasileiros. São feitos no Brasil.

Não quero aqui contestar a crítica de Fioratti sobre as escolhas formais do espetáculo: o jogo farsesco das revistas. Isso violaria o que considero mais sagrado: o patrimônio da opinião.

O que me instiga são as contradições objetivas dessa análise. Após sustentar que a farsa enfraquece o musical e se encontra esgotada, a crítica reitera que "de qualquer forma, as canções de Odair José combinam demais com o tom farsesco" (!?).

A montagem é qualificada por ele como "tecnicamente bem executada e cenicamente vistosa", "a banda, assim como os arranjos, merecem elogios" etc., no entanto, é reduzida ao "tédio" pelo crítico, numa noite em que a plateia pediu bis.

Vira um factoide para justificar uma linha editorial firme e cheia de a prioris. Isso, talvez, explique a dúbia frase: "Talvez não seja justo culpar Eu Vou Tirar... por um problema que pertence a um cenário inteiro".


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