Folha de S. Paulo


Grandes atores foram o centro do trabalho do diretor Mike Nichols

Um dos grandes diretores de atores do cinema mundial: não será exagero definir assim Mike Nichols, que morreu ontem, aos 83 anos, de um ataque cardíaco, segundo a rede ABC News, onde trabalhava sua mulher, a jornalista Diane Sawyer. Ele deixa três filhos: Max, Jenny e Daisy, do casamento com a escritora Annabel Davis-Goff.

É como se o centro de seu trabalho, ao longo de 41 anos de cinema, tivesse consistido em dar relevo aos atores.

Não por acaso, passaram por suas mãos, sucessivamente Elizabeth Taylor e Richard Burton ("Quem Tem Medo de Virginia Woolf?", 1966); Dustin Hoffman, Anne Bancroft, Katharine Ross ("A Primeira Noite de um Homem", 1967); Jack Nicholson, Candice Bergen, Ann-Margret ("Ânsia de Amar", 1971); Melanie Griffith, Sigourney Weaver, Harrison Ford ("Uma Secretária de Futuro", 1988); Meryl Streep, Shirley MacLaine ("Lembranças de Hollywood", 1990); Robin Williams, Gene Hackman ("A Gaiola das Loucas", 1996); Natalie Portman, Clive Owen ("Closer", 2004); Philip Seymour Hoffman, Tom Hanks ("Jogos de Poder", 2007).

Essa é, naturalmente, uma galeria reduzida, a partir dos 22 filmes que realizou. O certo é que, com Nichols, atores chegavam ao estrelato ou o recuperavam, estrelas ganhavam o status de atores, gente esquecida era relembrada.

TEMAS

Essa estava longe de ser a única virtude desse imigrante alemão nascido em Berlim em 1931, que chegou aos EUA em 1939, fugindo com a família do nazismo e da guerra na Europa. Vivendo no ambiente competitivo de Hollywood, soube conciliar como poucos a dignidade dos temas e das abordagens, sem nunca se distanciar do público.

Seu único Oscar de diretor, que lhe foi concedido em 1968, por "A Primeira Noite de um Homem", veio de um filme em que trata da oposição entre duas gerações: a do jovem casal formando por Hoffman e Ross e a dos pais. Um assunto candente do momento, que Nichols tratou como Hollywood gostaria que fosse tratado: sem ofender ninguém, no fim das contas.

As coisas não se passam assim em "Ânsia de Amar", no qual toca de frente questões polêmicas da sexualidade. O mundo então se abria à revolução de costumes, e o filme escrito por Jules Feiffer acabou se impondo.

Editoria de Arte/Folhapress
ESTRELADOOs principais prêmios e obras de Mike Nichols

Como sabia acompanhar a atualidade, Nichols tratou do arrivismo com desenvoltura em "Uma Secretária de Futuro". Como amava os atores, voltou-se à vida de uma atriz drogada em "Lembranças de Hollywood" (um filme especial, já que baseado nas memórias e no roteiro da atriz Carrie Fisher, a princesa Leia de "Guerra nas Estrelas").

Se tratou da vida de um casal homossexual com dignidade (e humor) em "A Gaiola das Loucas", fechou sua carreira com o inesperado "Jogos de Poder", em que trabalha de maneira original as funções de agente secreto e deputado, num filme que aborda a implicação dos Estados Unidos na derrota dos russos no Afeganistão.

Hoje é um dia em que todos os atores, tanto do cinema como do teatro –onde também foi um diretor de enorme destaque–, deverão chorar de verdade, pois perderam um grande mentor.

Podem chorar os cinéfilos, pois foi-se um cineasta vigoroso, honesto, popular e até o fim da vida capaz de interessar o espectador sem nem por isso perder a dignidade.


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