Folha de S. Paulo


Crítica: 1º livro de Jack Kerouac já mostra amor pela estrada

Durante 68 anos os manuscritos de "O Mar É Meu Irmão", o primeiro romance do escritor americano Jack Kerouac (1922-1969), repousaram em diversas gavetas de escrivaninhas nas dezenas de casas em que ele morou.

Escrito à mão na primavera de 1943, o livro foi publicado nos Estados Unidos somente em 2011 e agora chega aos leitores de língua portuguesa em edição da L&PM.

Além do pequeno romance (160 páginas), o livro tem mais duas partes. "Primeiros Escritos", que traz um Kerouac adolescente envolvido com a escrita de contos policiais, e "Kerouac e os Jovens Prometeicos", que revela a extensa correspondência entre ele e seu amigo de infância/juventude Sebastian Sampas, entre outubro de 1940 e dezembro de 1943, quando Sampas morre na batalha de Anzio, na Itália.

"O Mar É Meu Irmão" parece remeter o leitor à prosa de um escritor que foi influenciado por Kerouac e tenta imitar seu estilo. Nele encontram-se a maioria dos elementos kerouaquianos clássicos, como amor pela estrada e pela liberdade, o uso do estado alterado da mente como veículo de inspiração e a crítica à sociedade de consumo e ao capitalismo.

Mas o seu ritmo, contudo, está mais para a cadência do jazz tradicional do que para o desvario bebop que pontuou suas obras futuras.

O livro conta a história de dois jovens que se conhecem num bar em Nova York, Bill Everhart e Wesley Martin, e que, em menos de uma semana, embarcam num cargueiro rumo à Groenlândia.

Bill é um professor de literatura descrente da vida acadêmica, e Wesley, um solitário marujo apaixonado pelo oceano, que tem como plano de vida "tomar o mar para si, vigiá-lo, remoer sua própria alma nele, aceitá-lo e amá-lo".

A trama é um pretexto para Kerouac debater sobre os temas candentes da época, como o marxismo que vinha da experiência soviética, a Segunda Guerra Mundial e a escolha entre as duas opções de vida, aderir ao sistema ou marginalizar-se.

O Mar É Meu Irmão & Outros Escritos
Jack Kerouac
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A aventura no mar dura só dois dos oito capítulos e apresenta personagens como o marinheiro stalinista Nick Meade, que combateu o regime franquista na Espanha, um tipo intolerante e sectário, pronto a rotular qualquer um que discorde de suas ideias de reacionário ou fascista.

O abrupto final do livro, quando o navio ainda está longe de chegar à Groenlândia, deixa a impressão de que ele não passou de um ensaio para a próxima obra de Kerouac, "On the Road".

Numa das cartas a Sebastian Sampas, em 1943, aliás, ele já sinalizava a obra. "Tenho uma coisa em mente. Um romance que será uma saga de um poeta irresponsável, casual e inconsciente que perambula pela América, fazendo maluquices e procurando por pessoas boas."

O MAR É MEU IRMÃO E OUTROS ESCRITOS
AUTOR Jack Kerouac
TRADUÇÃO Rodrigo Breunig
EDITORA L&PM
QUANTO R$ 59 (512 págs.)
AVALIAÇÃO bom


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