Folha de S. Paulo


Análise: Festival de Brasília flagra esgotamento de jovens diretores

O Festival de Brasília do Cinema Brasileiro, um dos mais importantes do país, privilegiou em sua 47ª edição filmes de realizadores jovens e inquietos.

O grande vencedor vem do Distrito Federal. Mais precisamente da Ceilândia, cidade satélite de Brasília. É "Branco Sai. Preto Fica", elogiado longa-metragem do ex-jogador de futebol Adirley Queirós, que, entre outras coisas, promove a explosão simbólica da capital.

Num gesto muito festejado e pouco discutido, os competidores assinaram uma carta comunicando a partilha do prêmio de R$ 250 mil entre todos eles. Foi uma decisão política, e de fato interessante. É contrária ao valor disparatado que, segundo eles, reforça uma concorrência nada amistosa.

Divulgação
Cena de 'Branco Sai. Preto Fica', vencedor do Festival de Brasília do Cinema Brasileiro
Cena de 'Branco Sai. Preto Fica', vencedor do Festival de Brasília do Cinema Brasileiro

A seleção de filmes, por outro lado, não foi muito animadora. Os seis longas da competição, em diferentes medidas, flagraram o esgotamento de um tipo de cinema feito principalmente por jovens e destinado em geral ao circuito de festivais.

IDEIAS EM COMUM

Todos esses filmes respondem a (ou partem de) algumas ideias em comum: maior valor ao processo do que à dramaturgia, rompimento das fronteiras entre ficção e documentário, destaque ao afeto e à amizade, ausência de construção psicológica dos personagens, atenção ao tempo real.

Além disso, apresentam uma conexão com o neorrealismo italiano, sobretudo no desejo de tocar em temas sociais urgentes.

Desse modo, nos seis longas exibidos (e na maior parte dos curtas) vemos sinais de um esgotamento. Em quatro deles, os problemas são mais evidentes.

"Sem Pena" (escolhido como melhor filme pelo júri popular), de Eugênio Puppo, e "Brasil S/A", de Marcelo Pedroso (melhor direção e roteiro), apoiam-se unicamente em preocupações sociais que costumam gerar adesão automática.

"Ventos de Agosto" (melhor atriz, para Dandara de Morais, e fotografia), de Gabriel Mascaro, explora um tipo de contemplação que se revela fetichista. E "Pingo d'Água", de Taciano Valério, é preso a um registro que em momento algum se justifica.

Os longas mais interessantes conseguem escapar, até certo ponto, da limitação que os ameaça.

Em "Branco Sai. Preto Fica", a luta de moradores da Ceilândia é temperada pela ficção científica e pelo humor (no futuro, o poder estará nas mãos da Vanguarda Cristã, profetiza o filme).

Em "Ela Volta na Quinta", de André Novais Oliveira, o cotidiano de uma família em Contagem (MG) é mostrado sem pressa ou grandes conflitos. Ou seja: pedaços da vida, em sua incompletude e impermanência, de gente como a gente.


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