Folha de S. Paulo


Crítica: 'Magia ao Luar' é Allen mais interessante dos últimos tempos

De tempos em tempos, Woody Allen questiona a condição do artista. Será ele gênio ou charlatão? Ser iluminado ou simples executor de truques?

Essa é a questão central de "Magia ao Luar". Ali, o mágico Wei Ling Soo pratica os números que fizeram dele o maior prestidigitador do mundo. Quando tira a maquiagem, Wei Ling Soo torna-se Stanley, o homem da razão, aquele que só acredita no que vê e, sobretudo, homem dedicado a desmascarar os trapaceiros que, habilmente, procuram convencer os incautos de que existem o além, os espíritos, a vida eterna etc.

É o caso, agora, de Sophie, jovem norte-americana que surge na Riviera Francesa. Howard, velho amigo de Stanley, e também ele mágico, chama-o para testemunhar e desmascarar os truques do arco da velha que vêm fazendo de Sophie o xodó da temporada.

Esse é o princípio do novo Woody Allen, certamente o mais interessante do autor americano nos últimos tempos. Sophie representa, logo vemos, um real desafio para Stanley. Ele não consegue desmascarar a jovem vidente e após algum tempo se vê forçado a renegar sua crença racionalista e admitir que, de fato, a moça não é uma fraude.

Passemos pelo que se poderá ver como inverossimilhanças do roteiro: o mágico racionalista até a medula, por exemplo. Essa é uma das virtudes da fabulação, no entanto: não é um escritor ou um encenador que assumem os ares da razão, mas alguém cuja arte consiste, precisamente, na trapaça.

No mais, o fato de ser um consumado narcisista acentua o risco de sua empreitada: não é apenas sua convicção intelectual que coloca em jogo, mas o quase infinito amor próprio.

Passemos pelo romantismo por vezes exagerado que caracteriza o cinema de Allen e onde já se pode adivinhar, desde o início, no que dará o encontro entre o homem maduro e a ninfeta enganadora (ou não): não importa, trata-se de afirmar que neste mundo existe lugar para a magia e a maravilha.

A mise em scène de "Magia ao Luar" equilibra-se, com delicadeza e ousadia, entre crença e descrença, a verdade e a trapaça. E a partir desse embate postula um lugar para a vigarice neste nosso mundo policialesco. Por que não? Quem são os trapaceiros senão artistas?

MAGIA AO LUAR
(Magic in the Moonlight)
DIREÇÃO Woody Allen
PRODUÇÃO EUA, 2014
ONDE Caixa Belas Artes, Kinoplex Itaim e circuito
CLASSIFICAÇÃO 12 anos
AVALIAÇÃO ótimo


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