Folha de S. Paulo


Cafona nos anos 90, tatuagem se transforma em influência da moda

A patricinha cansou de ser patricinha e o playboy não quer mais parecer playboy. O ideal da contracultura, daquilo que parece proibido, tomou o guarda-roupa e o corpo das pessoas", diz o o skatista, ex-pichador e estilista Rafael Costa K., 27.

Segundo ele, a afirmação traduz a influência atual da tatuagem no universo da moda, desde a criação de roupas e de acessórios até a indústria dos modelos.

Ele lançará no próximo mês a marca de cuecas Underbrazil em parceria com tatuadores brasileiros e modelos tatuados até o pescoço, como o inglês Jimmy Q., que ajudarão a desenhar as estampas e os padrões das peças.

Eduardo Anizelli/Folhapress
O tatuador Jun Matsui com joias e moletom de sua grife, Lifeunderzen
O tatuador Jun Matsui com joias e moletom de sua grife, Lifeunderzen

Ao mesmo tempo, acontece em Paris, onde Rafael K. abrirá sua primeira loja em 2015, uma grande exposição sobre a história da tatuagem. A mostra de fotografia "Tatuadores, Tatuados" ficará em cartaz até outubro de 2015 no Museu do Quai Branly, explicitando a influência da expressão no universo pop.

Mestres da agulha como o paulista Zero, 32, e o recifense Jun Matsui, 42, e a estilista paulistana Fabia Bercsek, lançaram séries de ilustrações com traços inspirados em tatuagens que podem ser aplicadas tanto em camisetas quanto no próprio corpo.

Zero, apelido de Rodrigo Barbosa, começou a carreira na moda há sete anos, após perceber que não havia diferença entre o ofício de tatuador e o de criador de moda.

"Os dois trabalhos têm a ver com adorno corporal. A única diferença é que, no caso da tatuagem, esse adorno é permanente", diz Zero. Depois de criar para as marcas brasileiras Doc Dog e Pretorian, ele agora aplica estampas -ou "tatuagens vestíveis"- na marca Sumemo.

Criado na zona leste de SP, Zero diz que amigos tatuadores estão trocando agulhas por canetas em grifes nacionais.

"Os lados sombrio, sujo e decorativo da tatuagem são referência para a moda internacional. A [grife francesa] Givenchy, por exemplo, é hoje um dos maiores nomes desse movimento." O italiano Riccardo Tisci, estilista da marca, é um dos maiores defensores da cultura urbana transformada em roupas.

Em 2011, o modelo canadense Rick Genest, cujo rosto ostenta uma enorme tatuagem de caveira, desfilou para a grife Mugler e apareceu em um clipe da popstar Lady Gaga, detonando a onda de modelos super tatuados na moda.

Mas não foi sempre assim. Segundo a estilista Fabia Bercsek, 35, que faz desenhos para roupas e corpos, a tatuagem na moda era vista como um elemento subversivo e "até cafona" nos anos 1990.

"As pessoas não estavam preparadas para ver a tatuagem como expressão estética naquela época", afirma. Ela não cobra menos de R$ 2.000 por um desenho para o corpo.

A mistura entre moda e agulha custou a entrar na cabeça de um veterano tatuador brasileiro que diz ter desenhado nos corpos dos chefes da Yakuza, a máfia japonesa.

Jun Matsui fechou a Lifeunderzen, loja de roupas que mantinha em Tóquio há sete anos, por não conseguir diferenciar "a seriedade da cultura da tatuagem da efemeridade da moda". "Não sabia se estava certo ao criar joias e roupas baseadas nos desenhos."

Mas voltou atrás. Neste ano, disse ter aceitado que a tatuagem, assim como a moda, é "a maior expressão da vaidade". Para ele, o "momento é perfeito" para reinvestir em sua marca.

Em novembro, ele abrirá em SP uma nova loja de sua grife. Venderá moletons, camisetas, colares e até móveis estampados com os seus desenhos que, no corpo, não custam menos de R$ 6.000.


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