Folha de S. Paulo


'Sou barroco por natureza, nenhum baiano está imune', escreveu Ubaldo

Descrito pelos amigos como alegre e brincalhão, o escritor João Ubaldo Ribeiro, morto na manhã desta sexta-feira (18), foi autor de frases poéticas, assim como de colocações espontâneas e bem-humoradas.

O baiano morreu na madrugada desta sexta, aos 73 anos, vítima de embolia pulmonar, em seu apartamento, no Leblon, zona sul do Rio.

"Deve estar rindo da embolia e de todas as embolias de que somos vítimas", disse o ator Lima Duarte sobre o escritor e amigo.

Leia abaixo algumas frases marcantes do escritor:

"Meu nome era raramente divulgado entre os convidados [da Flip], aí eu decidi não ir. No release aparecia 'fulano, fulano, fulano e outros'. Esse 'outros' era eu. Aí eu disse: outros o caralho!", ao comentar, em 2011, por que não aceitou o convite da Flip de 2004.

"Não quero ser estrela, só não quero ir na rabada dos etcs., pois não sou um iniciante", ao comentar, em 2011, o cancelamento da ida à Flip de 2004.

"É bom saber que, enquanto escritor da língua portuguesa, pude cumprir, pelo menos no ver de meus contemporâneos, a minha obrigação com seriedade, denodo e amor, porque é desta língua que vivo e nada mais me enaltece do que imaginar que esta língua me agradece", ao receber o prêmio Camões em 2008.

"Gostaria de lembrar que se trata de 100 mil [euros]. Pode parecer muito, mas não compra as dependências de empregada de um apartamento aqui pertinho na [avenida] Delfim Moreira [Leblon, zona sul do Rio]. Portanto, não posso sair por aí como quem sai do "Big Brother" nem tampouco posar pelado, pois tenho o receio de que o mercado seria reduzido", ao saber que era o vencedor do prêmio Camões, em 2008.

"Recebo dezenas de originais, centenas de e-mails, solicitações as mais diversas. Como da amiga que posa nua e quer que eu faça uma frase dizendo como ela é linda pelada [caso das 'Playboys' de Maria Zilda e Vera Fischer], achando que é fácil. E não é, tem de suar o mês todo para imaginar algo de que fulana goste e que minha mulher não desaprove", sobre a dificuldade de lançar novos romances, em entrevista à Folha em 2008.

"De tanto escrever no feminino, um dia cheguei para minha mulher e disse: 'Estou cansada", sobre 'A Casa dos Budas Ditosos', em entrevista à Folha em 1999.

"Eu sou barroco pela própria natureza, ou pela própria formação. Nenhum baiano está imune ao barroco", em entrevista ao "Cadernos de Literatura Brasileira", do Instituto Moreira Salles, em 1999.

"Na época do 'Sargento Getúlio' eu bebia enquanto escrevia —depois deixei disso, porque bebendo você corre o risco de achar uma página deslumbrante e no dia seguinte vai ler e é uma droga", em entrevista ao "Cadernos de Literatura Brasileira", do Instituto Moreira Salles, em 1999.

"Eu sou composto de dois: o Grande Ubaldo, um sujeito boa gente, relaxado, e o Pequeno Ubaldo, que está sempre me cobrando", em entrevista ao "Cadernos de Literatura Brasileira", do Instituto Moreira Salles, em 1999.

"Não chego ao ponto de dizer que a alegria da velhice é poder peidar em público, mas é algo deste jaez, talvez menos escatológico", aos 70, em entrevista à Folha em 2011.

"Meu amigo Benebê, em Itaparica, sempre me diz, em impecável sotaque do Recôncavo, que 'o mundo é perfetcho'. E, de fato, o mundo é perfeito. Quem tem de plasmá-lo somos nós. E já pensaram se as coisas fossem como cada um quer? Não, o mundo é perfetcho e não há como mudar isso, a não ser eliminando nosso livre-arbítrio", em entrevista ao caderno "Mais", na Folha, em 1999.

"Aqui na Bahia, por alguma razão insondável, o pessoal acha que é branco. É muito interessante, considerando que, provavelmente, os únicos residentes desta cidade de Salvador que passariam num teste tipo África do Sul seriam o cônsul da Noruega e mais uns dois padeiros espanhóis, e olhe lá", em coluna no caderno "Folhetim", na Folha, em 1980.

"Naturalmente que gosto de escrever, é minha profissão e, ao que tudo indica, minha vocação. Mas o sofrimento existe, de várias formas, inclusive pela incerteza, que sempre me aflige, sobre se vou conseguir chegar ao fim de um romance", em texto especial para a Folha em 1992.

"Numa cultura acostumada a privilégios, poses e geral mistificação, já fui grandemente esnobado por não aceitar reivindicações mágicas para a condição de escritor. Nunca tratei minha profissão solenemente, nunca achei que ela por alguma razão me faz melhor que os outros", em texto especial para a Folha em 1992.

"Eu gosto muito de Glauber [Rocha, cineasta], é um amigo, mas normalmente não gosto dos filmes de Glauber. Aí você vira assim, 'você é um reacionário, um louco'. Não. Eu não gosto porque Glauber é vítima de um esforço de que eu também sou vítima, que é a construção de uma estética do Novo Mundo, de um estética nossa, porque nós nos sentimos inferiorizados, porque não conhecemos marcas de vinho, porque não sabemos nos portar na mesa", em entrevista ao caderno "Folhetim", na Folha, em 1977.

"Quanto a Oswald de Andrade, sempre se referem ao canibalismo dele como relacionado com o que aparece em meu livro 'Viva o Povo Brasileiro'. Mas eu nunca pensei nesse diálogo, a não ser recentemente, quando passaram a fazer esse tipo de pergunta", durante a Flip em 2011.

"Deus não tem pressa nenhuma, para Ele tudo é ontem, hoje e amanhã, só quem vive dentro do tempo somos nós", trecho do livro "Miséria e Grandeza do Amor de Benedita", de 2000.

Editoria de Arte/Folhapress

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