Folha de S. Paulo


Curadores atacam mostra sobre desabamento de obra de Niemeyer

Organizadores de uma retrospectiva da obra de Oscar Niemeyer agora em cartaz no Itaú Cultural, em São Paulo, Lauro Cavalcanti e Pedro Mendes da Rocha, divulgaram um texto de repúdio a um trabalho da artista Lais Myrrha, inspirada pelo desabamento de uma construção do arquiteto e agora também exposta no Pivô, centro cultural que ocupa um andar do edifício Copan.

Em uma megainstalação, Myrrha reproduziu a disposição das vigas do parque de exposições da Gameleira como aparecem numa fotografia de 1971, quando o prédio ruiu e matou mais de cem operários. O episódio conhecido como tragédia da Gameleira, o bairro de Belo Horizonte que abrigava a construção, é ainda hoje um ponto obscuro na trajetória de Niemeyer.

Estado de Minas/O Cruzeiro
Desabamento do complexo de exposições em BH, de Oscar Nimeyer, que inspirou trabalho recente de Laís Myrrha, no Pivô
Desabamento do complexo de exposições de Oscar Nimeyer, que inspirou trabalho de Laís Myrrha

Joaquim Cardozo, calculista da obra, chegou a ser ouvido pela Justiça à época e acabou encerrando sua carreira após o ocorrido. Niemeyer, que estava exilado na Europa, não deu declarações públicas sobre o acidente.

"É curioso que alguém se arvore em cobrar ética de dois mortos, faça uma cenografia da tragédia e, em pose glamorizada para os jornais, explore outros tantos mortos", escreveu Cavalcanti. Ele se refere à instalação de Myrrha, que fala em "silêncio do arquiteto" e a um painel no Pivô com os nomes dos mortos no acidente. "O silêncio de Niemeyer e Cardozo só se deu na cabeça da expositora."

Em texto publicado no site do Pivô, Myrrha rebateu as acusações de "leviandade e oportunismo" levantadas por Cavalcanti e Mendes da Rocha. Myrrha chegou a lembrar que foi premiada por um edital do Paço Imperial, instituição no Rio dirigida por Cavalcanti, por uma obra da mesma série da que exibe agora.

Divulgação
Detalhe de obra da artista Lais Myrrha exposta no Pivô, em São Paulo
Detalhe de obra da artista Lais Myrrha exposta no Pivô, em São Paulo

"Sabia que estava mexendo num vespeiro dada a importância de Niemeyer para a arquitetura e as esferas do poder político e simbólico no Brasil", escreveu Myrrha. "Quanto ao Joaquim Cardozo, sempre ao mencioná-lo, é com grande reverência e levantando a suspeita de que ele foi injustiçado. Essa suspeita consta no texto da obra. Quanto ao Niemeyer, seu silêncio é imperdoável. Procurei uma declaração qualquer que fosse sobre o assunto e não achei quase nada."

Myrrha reproduz em seu texto um trecho de uma reportagem do jornal "Estado de Minas" de 12 de março de 1971 que afirma que "Niemeyer, preocupado com o noticiário internacional sobre o desabamento da obra por ele projetada, telefonou para o engenheiro Joaquim Cardozo, hipotecando-lhe solidariedade".


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