Folha de S. Paulo


Exposição na Oca repassa últimos 30 anos da arte ácida e colorida da China

É uma China cínica, ácida, para não dizer estridente e escalafobética, que aparece na arte contemporânea desse país nas últimas três décadas.

Ocupando quase toda a Oca, no parque Ibirapuera, a megamostra "ChinaArteBrasil" tenta agora traçar para o público ocidental e dos trópicos um panorama visual do gigante asiático, com algo do bom e muito do bizarro que surgiu por aquelas terras.

Do muro de lambe-lambes que anunciam computadores a preço de banana, obra de Wang Qingsong, ao bebê de cores radioativas empunhando uma garrafa de Fanta, dos Luo Brothers, a arte chinesa recente ilustra a oposição total entre atração e repulsa.

Isso porque duas correntes antagônicas estão por trás da obra desses artistas. De um lado, é uma arte fruto da rebeldia contra as restrições da Revolução Cultural maoísta, a ditadura ideológica que foi de 1966 a 1976. De outro, é um resgate de tradições que ganhou força nos anos 1980.

Também parece haver uma relação de amor e ódio com o Ocidente. Nos primórdios da abertura econômica chinesa, a arte do país incorporou símbolos ocidentais —daí Fanta, Coca-Cola e McDonald's figurarem nos quadros— na ânsia de criar um discurso alinhado à contemporaneidade.

Mais adiante, o jogo se inverte. O Ocidente sai de cena, e símbolos da China mais tradicional são ressignificados numa visualidade que contesta as suas próprias origens.

"Eles tentavam se igualar à realidade ocidental, mas agora se voltam para a própria cultura", diz Tereza de Arruda, uma das curadoras da mostra. "São críticos e irônicos, aludindo a essa ditadura com liberdade econômica."

Ninguém foi mais contundente nesse processo do que o artista e ativista Ai Weiwei, que tem na mostra uma enorme escultura com partes de bicicletas, espécie de lamento pela decadência do meio de transporte que vem dando lugar aos carros na China.

"Essa é a natureza típica da arte chinesa", diz Lu Song, um dos artistas da mostra. "Tudo tem um senso cínico."

No caso, mesmo sua pintura —paisagens mais ou menos abstratas— atesta esse cinismo ao deturpar esse gênero clássico da pintura. Suas paisagens, longe do idílio que parecem mostrar, não passam de jardins acanhados das megalópoles chinesas.

"Tenho interesse por lugares fronteiriços, subúrbios", diz Song. "É como se fosse um espelho em que as coisas vão surgindo na hora de pintar, uma natureza sintética."
Nessa natureza, aliás, não cabem mais florestas de bambu nem ursinhos panda.

"Esses artistas não precisam mais pintar esses símbolos", diz Ma Lin, outra curadora da mostra. "Eles pensam o passado do ponto de vista histórico ao mesmo tempo em que miram o futuro. Há uma circularidade do tempo."

Isso é nítido na pintura de Huang Ju, que retrata crianças ou bonecos estilizados em várias fases de crescimento.

"É minha maneira de reagir contra o mundo, devolver espontaneidade a um universo todo pré-determinado", diz o artista. "Não uso símbolos, a não ser aqueles que já estavam dentro de mim."

CHINAARTEBRASIL
QUANDO de ter. a dom., das 9h às 18h; qui., das 11h às 22h; até 18/5
ONDE Oca, pq. Ibirapuera, portão 3, tel. (11) 3105-6118
QUANTO R$ 20; grátis às terças


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