Folha de S. Paulo


Em novo trabalho, Romulo Fróes busca 'beleza onde não há'

Na noite de uma quarta-feira chuvosa, o cantor e compositor Romulo Fróes reuniu sua turma para apresentar, em clima de ensaio aberto, na pequenina Casa de Francisca, em São Paulo, suas mais recentes canções, fruto de parcerias com o artista Nuno Ramos, entre outros.

Na plateia, estavam presentes o "pós-sambista" Rodrigo Campos, o rapper Criolo e a cantora Juçara Marçal, que, com voz potente, vem se afirmando na cena independente —ela acaba de disponibilizar um trabalho, "Encarnado", para download gratuito em seu site.

Acompanhado por um baixo acústico e uma guitarra (ficou faltando o saxofone, a cargo de Thiago França, do Metá Metá), Fróes subiu ao palco para apresentar as 17 canções de "Barulho Feio", quinto CD de sua carreira, a ser lançado neste ano.

Por que "Barulho Feio"? "Minha única certeza é com relação ao título que escolhi. Porque se trata de buscar a beleza onde não há, criar algo belo com elementos que a priori não o são", diz Fróes.

Isso se traduz em canções envoltas em atmosfera enigmática, com elementos distorcidos, criando uma sensação de caos —como a guitarra que se sobrepõe à voz ou um baixo que faz a música ir para trás. É, de certa forma, a evolução do experimentalismo que se desenha desde seus trabalhos anteriores.

Raquel Cunha/Folhapress
O cantor e compositor Romulo Fróes
O cantor e compositor Romulo Fróes

Mas nunca Fróes chegou tão longe ao experimentar. É a transgressão da canção clássica que está em pauta, mas sem abrir mão dos fundamentos. Por mais que apareça picotada ou desconstruída, a forma persiste, e a voz e o violão de Fróes são o eixo.

"Barulho Feio" é também uma canção em parceria com Nuno Ramos. Fróes foi seu assistente por 16 anos, inclusive durante a polêmica dos urubus na Bienal de 2010.

Cercados por uma rede, três urubus faziam parte da obra "Bandeira Branca", de Ramos. Após protestos, o Ibama revogou a autorização que havia concedido e a obra foi desmontada. A música trata do episódio: "Ninguém cantará, ninguém sambará, ninguém pintará, ninguém vai se lembrar de mim".

A música de Fróes sempre dialogou com a arte, seja pela sonoridade, seja pela narrativa das composições, sobre temas que aparentemente não tratam de um assunto específico, com imagens fortes. O artista plástico Clima é outro parceiro nas letras.

O músico também pretende lançar uma releitura de músicas de Nelson Cavaquinho até 2015. Embora seja um dos expoentes de uma geração que revirou a MPB, rejeita rótulos: "É difícil falar em nova geração, quando já estou fazendo 43 anos", diz.

Para ele, o denominador comum entre sua música e, digamos, a de Mallu Magalhães, Cidadão Instigado, Tulipa Ruiz ou Curumin é a falência da indústria musical.

"Somos de uma geração que precisou encontrar meios para produzir, divulgar e construir carreira. A internet é nossa igreja e a diversidade, nossa praia. Agora, falar de MPB e tentar colocar todos debaixo de um guarda-chuva a esta altura é bizarro".

A apresentação terminou sob aplausos calorosos. Em fase final de gestação, "Barulho Feio" já mostra consistência única. Ninguém sai do show como entrou.


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