Folha de S. Paulo


Cresce pressão por leilão de arte em Detroit após falência da cidade

Os personagens conversam, bebem, se beijam, dançam ou apenas observam. É uma celebração, apesar do olhar dúbio de alguns deles.

A festa, porém, tem lugar apenas na tela. Na vida real, a pintura "A Dança do Casamento" (1566), de Bruegel, o Velho, se transformou no centro de uma celeuma dentro da derrocada da cidade norte-americana de Detroit.

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Uma equipe da casa de leilões nova-iorquina Christie's acaba de realizar uma avaliação dos valores das obras do DIA (Detroit Institute of Arts), o mais famoso museu da ex-capital da indústria do carro.

Desde que a cidade pediu falência no ano passado (aceita em dezembro pela Justiça), credores têm olhado para o acervo. Apesar de apenas 5% do seu conjunto pertencer à municipalidade, é forte a pressão para que todas as obras sejam vendidas para ajudar a reerguer a cidade.

"O que acontecer aqui em Detroit pode servir de precedente a várias cidades dos EUA em que essa alternativa está sendo pensada. A repercussão negativa seria imensa para o patrimônio dos museus", diz à Folha Peter van Dyke, do Detroit Arts Market, que trabalhou anos no DIA.

"A Dança do Casamento" é a obra mais valiosa do museu (US$ 200 milhões; cerca de R$ 475 milhões), seguida de um autorretrato de Van Gogh (US$ 150 milhões; R$ 357 milhões) e da tela "A Visitação", de Rembrandt (US$ 90 milhões; R$ 214 milhões).

No total, a Christie's avaliou 2.773 das 66 mil peças da coleção. A soma ficou em US$ 867 milhões (mais de R$ 2 bilhões). As dívidas de Detroit somam cerca de US$ 25 bilhões (cerca de R$ 59 bilhões).

Fundado em 1885, o DIA reúne telas de Caravaggio, Gauguin, Picasso, Matisse, Tintoretto, esculturas de Rodin e dois murais de Diego Rivera, que retratam o auge da indústria do carro, quando Detroit era a quarta cidade mais poderosa dos EUA.

Em comunicado, o DIA disse que "continua a manter sua posição de que a coleção do museu é uma fonte cultural e não uma propriedade qualquer do Estado" e que se recusa a vender as obras. O caso está na Justiça, sem data para um desenlace.

Enquanto isso, a visitação tem aumentado. "Cada vez que sai uma notícia de que as obras serão vendidas, o público aparece em grande número, é um apoio silencioso à manutenção do patrimônio", diz Jeff Johnson, funcionário da loja do museu.

Não é a primeira vez que os habitantes se unem para defender a coleção. Em 2012, foi aprovada a destinação de parte de um imposto para o DIA. "Ao longo de sua história, doações de particulares foram comuns e eram suficientes. Agora não é mais o caso", diz Van Dyke.

Algumas alternativas à liquidação do museu estão sendo pensadas, como empréstimos, turnês de exposições itinerantes pelo interior do Estado de Michigan ou até a venda a particulares, que depois as doariam de volta à instituição.


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