Folha de S. Paulo


Diretor de "Além da Fronteira" fala sobre tensão entre gays israelenses e palestinos

O diretor israelense Michael Mayer, radicado nos EUA, aponta a sua câmera para uma questão inflamável: no filme "Além da Fronteira", que estreou na última sexta-feira, ele retrata um caso de amor proibido entre um palestino e um israelense no limite entre os dois territórios.

Além da tensão política, o cineasta, que fez serviço militar em Israel e se mudou para Los Angeles em 1996 para estudar cinema, explora o clima hostil de quem se assume gay numa família ortodoxa e luta para viver de maneira clandestina em outro país.

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Cena do longa israelense
Cena do longa israelense "Além da Fronteira", do diretor Michael Mayer

"Isso não ocorre apenas na Palestina, se você nasce num ambiente tradicional, que não aceita a sua orientação sexual, seu caminho natural é mudar para uma cidade maior", diz Mayer sobre as dificuldades encontradas pelo personagem Nimr (Nicholas Jacob, que nunca havia atuado antes), um estudante palestino que cruza a fronteira até Tel Aviv, onde conhece um advogado israelense, por quem se sente atraído.

O que torna a situação singular no filme de Mayer é o fato de se tratar de um território ocupado e com dura vigilância de forças de segurança. "A decisão nesse caso é mais complicada porque você não tem documentos para deixar o país, tem que viver ilegalmente", diz.

Para filmar em Ramallah, na Palestina, o diretor usou uma equipe reduzida, só com atores e o diretor de fotografia, com o cuidado de não chamar a atenção das autoridades locais. Mayer afirma que não possuía permissão para fazer cenas na cidade. Mesmo assim, foi em frente, tendo que se disfarçar como turista em alguns momentos.

A trajetória de Nimr é contada como se fosse uma via-sacra. Primeiro, ele esbarra nos trâmites burocráticos que o impossibilitam de conseguir uma licença para estudar fora de seu país. Há leis incertas, e as aplicações delas são tendenciosas. Depois, ainda mais doloroso para ele, é ser rejeitado pela própria família, que o acusa de traidor.

O irmão não aceita as suas decisões e a mãe o expulsa de casa. Até ser acolhido na casa de Roy, o advogado bem de vida interpretado por Michael Aloni. Tudo se desenrola por baixo do pano, em festas secretas realizadas em casas particulares.

"Muitos gays palestinos cruzam a fronteira para ir a encontros underground em Tel Aviv", diz Mayer. "Essas festas continuam sendo feitas uma vez por mês. Foi onde eu encontrei o figurinista do meu filme [Hamada Atallah], um dos responsáveis por organizar os eventos."

A sensação de deslocamento constante e de insegurança dos personagens dá um caráter humano a um conflito de fundo político. Mayer explica que "não buscou contar a história do conflito, mas a de pessoas apaixonadas que brigam pela sua identidade". Quis tocar em temas como "lealdade e relações familiares".

O filme foi exibido no Festival de Haifa, em Israel, onde foi visto tanto por palestinos quanto por israelenses. Segundo o diretor, a recepção foi positiva e não houve contestação da plateia. A vontade de Mayer, agora, é projetar o filme na Palestina. "Meus produtores e distribuidores estão trabalhando para exibir o longa em universidades na Palestina, mas até agora não foi possível."


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