Folha de S. Paulo


Crítica: Francês 'Um Estranho no Lago' evoca grandes 'thrillers' do passado

Na praia de "Um Estranho no Lago", cada um que chega é um espetáculo para os homens deitados nas pedras ou sentados nas toalhas. É como se cada espectador fosse também um espetáculo.

No entanto, nós é que somos introduzidos a esse estranho mundo homossexual, onde rapazes e homens maduros passeiam pelados pelo bosque ao lado, em busca de um companheiro ou apenas para se masturbar.

Mas, não nos enganemos, não é um filme gay. Este mundo gay em que somos a um tempo os curiosos e o objeto de curiosidade, embora descrito com precisão (e sem pudor) é apenas o pano de fundo deste "thriller".

Divulgação
Dois amantes em cena do francês 'Um Estranho no Lago', de Alain Guiraudie
Dois amantes em cena do francês 'Um Estranho no Lago', de Alain Guiraudie

Nele, destacam-se três personagens. Franck é um jovem que se sente atraído por Michel. E vice-versa. Mas Michel tem um amigo ciumento. Para satisfazer seu desejo e se aproximar de Franck, Michel o afoga. O quarto personagem da trama é Henri: o solitário gordo e triste com quem Franck faz amizade na praia.

Até o assassinato, o filme fixa-se no universo homossexual, sua diversidade e particularidades. Daí por diante, Alain Guiraudie, o autor deste filme, restitui à praia o caráter de estranhamento que experimentamos nos primeiros momentos.

No começo não há mistério: Franck vê o crime e não se opõe. Graças a ele poderá aproximar-se de Michel. Aos poucos, no entanto, alguns elementos vão se encontrando para evocar os grandes "thrillers" do passado. Aqueles em que o mal se insinua, quase disfarçadamente, para adquirir uma presença cada vez mais opressiva.

Estamos num território atual, mas ali também o passado se insinua: são os personagens de Hitchcock (quem: o tio sinistro de "A Sombra de uma Dúvida", o psicopata de "Pacto Sinistro"?). Ou de Fritz Lang (com a malícia e as mudanças de tom de "Suplício de uma Alma")?

Talvez mais que todos ele nos lembre o pastor celerado de "O Mensageiro do Diabo", de Charles Laughton, com as palavras "amor" e "ódio" inscritas nos dedos. Aqui não há marcas desse tipo, mas tudo também gira em torno de duas palavras: desejo e morte. Pensando bem, essa história de sexo, morte e terror, também não passa tão longe assim de "O Império dos Sentidos", de Nagisa Oshima.

UM ESTRANHO NO LAGO
DIREÇÃO Alain Guiraudie
PRODUÇÃO França, 2013
ONDE Cine Livraria Cultura e Reserva Cultural
CLASSIFICAÇÃO 16 anos
AVALIAÇÃO ótimo


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