Folha de S. Paulo


Crítica: 'O Olho do Mundo' repete Saga do Anel que o inspira

Em que ponto termina a homenagem literária e começa o simples pastiche? A pergunta é inevitável para quem lê "O Olho do Mundo", primeiro dos 14 volumes da saga de fantasia "A Roda do Tempo", do americano Robert Jordan (1948-2007).

Jordan (pseudônimo de James Oliver Rigney Jr., veterano da Guerra do Vietnã e engenheiro nuclear) nunca escondeu que o começo de sua saga foi inspirado pelo início de "O Senhor dos Anéis", de J.R.R. Tolkien, obra que é o modelo de todas as epopeias fantásticas modernas.

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Assim, no lugar dos hobbits e de seu bucólico Condado, a ação de "O Olho do Mundo" começa na região dos Dois Rios, lar de agricultores e aldeões, normalmente protegido dos perigos sobrenaturais que assolam o resto de seu mundo ficcional.

É claro que esse isolamento acaba indo para o espaço com uma invasão dos monstruosos trollocs, guerreiros com cabeças de lobos, bodes e outras feras, liderados por um Myrddraal, cuja aparência é a de um cavaleiro totalmente envolto em um manto negro. (Qualquer semelhança com os orcs e os Espectros do Anel da obra de Tolkien não é mera coincidência).

Outros repetecos: o grupo de amigos jovens e inexperientes (Rand, Mat, Perrin e Egwene) destinado a ter um papel-chave na luta do bem contra o mal, a figura do mentor adepto das artes mágicas (no caso de Jordan, para variar um pouco, é uma mentora) e o guerreiro que é herdeiro de um reino perdido.

Em vários casos, cenas inteiras parecem ser paráfrases da Saga do Anel --e, na comparação, Jordan perde, já que não era nem de longe um prosador tão hábil como Tolkien.

Isso não significa, no entanto, que "O Olho do Mundo" seja despido de qualidades ou de originalidade.

Inspirando-se em religiões e filosofias orientais, como o taoísmo, o autor atribui os poderes mágicos de seus personagens à capacidade de canalizar dois princípios cósmicos complementares, o "saidar", descrito como feminino, e o "saidin", masculino --mais ou menos como o 'yin' e o 'yang' chineses.

A tragédia primordial desse universo é que o "saidin" acabou sendo corrompido, levando os homens que o canalizam à loucura.

Somam-se a esses conceitos pitadas de hinduísmo, como o tempo cíclico e a repetição a cada era do confronto entre o demoníaco Shai'tan (é, o nome poderia ser mais criativo) e o Dragão, líder das forças do bem.

Para quem já foi fisgado pela literatura de fantasia, a receita tem funcionado -calcula-se que a série tenha vendido perto de 50 milhões de exemplares.

O OLHO DO MUNDO
AUTOR Robert Jordan
TRADUÇÃO Fábio Fernandes
EDITORA Intrínseca
QUANTO R$ 49,90 (800 págs.)
AVALIAÇÃO regular


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