Folha de S. Paulo


Festival MixBrasil exibe versão 'comportada' de filme para não constranger autoridades

O filme de abertura do 21º Festival MixBrasil, "Interior. Leather Bar.", foi exibido na noite desta quinta (7) para convidados numa versão sem as cenas de sexo oral entre homens e de masturbação que constam do corte original.

Questionado após a exibição, André Fischer, diretor do festival sobre diversidade sexual e presidente da associação Mix Brasil, disse que a versão foi escolhida por causa das autoridades presentes. "Não dá para mostrar um monte de paus para as autoridades", afirmou à Folha.

O filme dirigido por James Franco e Travis Mathews foi exibido em três salas ao mesmo tempo no Centro Cultural São Paulo.

Na sala principal, em que estavam as autoridades, o público viu a "versão cinema" --como é chamado por Mathews o filme sem as cenas explícitas--, com um corte produzido pelos próprios diretores para conseguir emplacá-lo em salas comerciais da Europa e dos Estados Unidos.

Já nas outras duas salas, "Interior. Leather Bar." passou em sua versão sem cortes. As cenas cortadas totalizam quase um minuto de duração.

Na abertura do festival estavam presentes Rogério Sotilli, secretário municipal de Direitos Humanos e Cidadania de São Paulo, e Marcelo Araújo, secretário de Estado da Cultura de São Paulo. Segundo Fischer, a princípio, era possível que a ministra da Cultura, Marta Suplicy, também comparecesse.

"Deveriam ter passado a mesma versão para todo mundo. Tenho dificuldade em me constranger", disse Sotilli, que deixou o evento antes da exibição. Araújo não foi localizado pela Folha para comentar o episódio.

Procurado novamente hoje pela reportagem, Fischer disse que a abertura do MixBrasil nunca exibe filmes com cenas de sexo explícito e que tenham classificação etária 18 anos por causa do público, diferente do que frequenta as sessões dos demais dias do festival. "A abertura é um momento em que se convida as pessoas, tem que ser um filme mais abrangente".

CENSURA

"Interior. Leather Bar." parte da polêmica sobre os 40 minutos que foram excluídos do filme de 1980, "Parceiros da Noite", de William Friedkin, para questionar a forma como o sexo é representado pelo cinema.

No filme de Friedkin, o policial interpretado por Al Pacino passa a frequentar boates sadomasoquistas da noite gay de Nova York para desvendar um crime. Para poder ser exibido no circuito comercial, o filme teve cenas cortadas nunca exibidas e que se perderam.

Mathews, que mostra cenas de sexo não simulado em seus filmes, disse, antes da abertura do festival, que o cinema gay está ganhando mais espaço. "As histórias estão amadurecendo e a sexualidade está se tornando algo que dá forma ao personagem, mas não o define, acho que isso torna nossas histórias mais aceitáveis para um público mais comercial (heterossexual)", afirmou por e-mail à Folha na terça (5).

Ele não foi localizado pela reportagem para comentar a exibição da versão cortada do filme num festival sobre diversidade.

Em "Interior", James Franco aparece conversando com o ator Val Lauren, que volta ao personagem de Pacino, sobre o projeto do filme. Ele defende que o sexo seja usado como ferramenta para se contar uma história. "Todos falam sobre sexo, mas não ouse colocá-lo em um filme", critica.

"Interior. Leather Bar." ainda será exibido, sem os cortes, em duas sessões durante o festival. Para a abertura da edição no Rio, ele está programado na "versão para autoridades".


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