Folha de S. Paulo


'Para que fazer cinema se não for para arriscar?', diz diretor de 'Boa Sorte, Meu Amor'

"Boa Sorte, Meu Amor" não é um filme fácil. Em preto e branco, com longas cenas sem cortes em monólogos disfarçados de diálogos e trilha em volume alto que se confunde com os sons do ambiente e da cidade do Recife, o longa de estreia do diretor Daniel Aragão não segue a cartilha de cinema popular.

A opção pelo experimentalismo ajudou a garantir a boa recepção crítica do longa, que ganhou o prêmio de melhor filme pelo Júri Jovem no Festival de Locarno, na Suíça, de melhor direção no Festival de Brasília e menção honrosa à fotografia no Hollywood Brazilian Film Festival.

Não foi suficiente para que a obra ganhasse espaço no circuito. Em São Paulo, onde estreou na última sexta-feira (13) o filme tem apenas uma sessão, às 18h, no Espaço Itaú Frei Caneca.

Aragão afirma que buscou um equilíbrio entre sua visão artística e um filme que fosse aceito pelo público.

Ele observa que os personagens poderiam ter saído de uma novela. A trama também. Rapaz conhece garota, os dois se apaixonam, mas têm a relação afetada por seus passados e origens.

"Eu sou um cara que gosta muito de folhetim, de histórias vulgares e comuns", diz. "Milhares de outras histórias assim já foram contadas, então eu sou obrigado a fugir um pouco do convencional. Se eu fosse contar de uma forma normal, o filme teria três horas e meia."

A fuga também representa uma busca por sua própria visão, por uma conexão sentimental com a narrativa. "Apesar de tudo, tenho consciência que o espectador existe. Não quero deixá-lo entediado, mas é uma questão de descobrir um novo cinema que seja um pouco popular, mas também artístico. Para que eu vou fazer cinema se não for para arriscar?"

SACO CHEIO

Aragão, que foi assistente de direção em "Cinema, Aspirinas e Urubus" (Marcelo Gomes, 2005), conta que não gosta de preparar os atores e prefere que eles entendam o que os personagens sentem. Isso ajudaria em cenas longas, como as em que os personagens expõem suas origens e falam por um bom tempo sem interrupção.

"O Vinicius [Zinn, que faz o protagonista Dirceu], tinha trabalhado em "A Casa de Alice" [Chico Teixeira, 2007]. Eu gosto muito desse filme e queria trabalhar com ele", diz. "Já a Chris [Christiana Ubach, que vive Maria] faz parte dessa busca por um ator de novela. Ela tinha acabado de sair de 'Malhação' e eu achava que ela tinha sido mal aproveitada."

Em seu próximo filme, "Prometo um Dia Deixar Esta Cidade", que deve começar a ser rodado em outubro, Aragão também explora outro ator saído da novela jovem, Sergio Marone. "Existe uma forma de preconceito às avessas dentro do chamado 'cinema de arte'. É um meio muito fechado", diz. De acordo com o diretor, alguns atores não são escolhidos para certos filmes exatamente por serem mais famosos ou populares.

"Estou meio de saco cheio disso. Acho legal tentar inverter essa ideia de uma Hollywood brasileira", afirma. "A gente está vivendo em um momento tão cíclico que as pessoas nem lembram mais quem é famoso e quem não é mais. Quando percebi isso é que eu vi que estava ficando louco por não querer colocar um cara só porque ele já foi famoso. O importante é se ele vai acrescentar ao papel."

BOA SORTE, MEU AMOR
DIREÇÃO Daniel Aragão
PRODUÇÃO Brasil, 2012
ONDE Espaço Itaú Frei Caneca (18h), em São Paulo, e Rio, Brasília, Porto Alegre, Florianópolis, Salvador e Natal
CLASSIFICAÇÃO 16 anos


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