Folha de S. Paulo


Família de Renato Russo quis nos excluir, diz baterista da Legião Urbana

Em entrevista à Folha, o baterista Marcelo Bonfá comemorou a decisão de poder usar a marca Legião Urbana e fez críticas à família de Renato Russo.

"Eu fico muito feliz com esse resultado. Essa decisão foi aceita com base em fatos. O que é chato é a gente [Bonfá e Dado Villa-Lobos] ter que se mobilizar. Do lá de lá [dos herdeiros do cantor] sempre teve um empenho em nos excluir", disse Bonfá sobre a decisão liminar.

"O Renato sempre foi uma pessoa muito democrática, sempre abriu espaço para a gente se expressar, sempre dividiu tudo. A história foi construída pelos três. Eu entreguei minha vida àquilo durante anos, para chegar alguém numa hora e dizer 'perdeu', não pode mais usar?", questiona. "Eu saio na rua e as pessoas dizem 'e aí, Legião'. A associação é inevitável", completou Bonfá.

Segundo o baterista, que hoje segue em carreira solo, mesmo com a autorização para que ele e Dado usem a marca Legião Urbana, não há a intenção por parte deles de retomar as atividades da banda.

"Nós não temos intenção de usar a marca, a gente só quer tocar. As pessoas associam o nome a mim e ao Dado. Desde o início a intenção do lado de lá era nos retirar. Naquele projeto da MTV --em 2012, a emissora promoveu um tributo à Legião com Dado, Bonfá e o ator Wagner Moura nos vocais--, a família dificultou muito. Agora, neste último --'Renato Russo Sinfônico', show realizado no mês passado no estádio Mané Garrincha, em Brasília, com um holograma de Renato--, fui convidado uma semana antes. E não participei porque não compactuava com aquele tipo de concepção artística", disse o baterista.

O guitarrista Dado Villa-Lobos considerou a decisão liminar como a reparação de "um erro histórico". Em entrevista à Folha, o músico também se queixou de dificuldades impostas pela família de Renato Russo.

"É uma questão ética, é a justiça sendo feita. Como assim, eu não posso homenagear a todos nós da Legião? Foi o caso da MTV, do Rock in Rio, uma série de dificuldades. Fomos convidados para tocar no Lupaluna [festival de Curitiba], mas eles não autorizaram", disse Dado.

"Existia essa urgência de se livrar dessa condição incômoda e bizarra. É a chance de reverter um erro histórico. A gente nunca foi uma banda com pensamento corporativo, de pensar em marca. Todo mundo era sócio da empresa, depois cada um montou a sua, mas gerou toda essa confusão depois da morte do Renato", completou o músico.

OUTRO LADO

A Folha entrou em contato com o Giuliano Manfredini, filho e único herdeiro de Renato Russo, para que comentasse o caso, mas ele não respondeu ao pedido de entrevista. Nesta tarde, advogados e o filho do cantor têm uma reunião marcada. A família de Renato Russo ainda não foi notificada e pode recorrer da decisão.

A Legião Urbana Produções Artísticas, que preferiu se pronunciar por meio de sua assessoria de imprensa, disse que irá recorrer da decisão liminar. "Em todas as oportunidades em que eles [Dado e Bonfá] pediram autorização para usar a marca, em projetos como Rock in Rio e aquele da MTV, ela foi dada na hora. Nunca foram cobrados, pelo contrário, receberam. Sempre foram tratados como membros da banda", disse o assessor Ruy Nogueira.

"Recentemente, eles fizeram uma turnê pelo Uruguai usando o nome da banda. Nos termos da lei, isso não foi legal, mas jamais foram impedidos. O Giuliano ficou muito decepcionado com esse comportamento dos dois. Ele é o único herdeiro da memória do pai dele, não é um parasita, sempre incentivou a difusão do nome e da obra do pai", completou a assessoria.

Nogueira também afirmou que Dado e Bonfá fazem parte da história da Legião Urbana, mas que a "banda morreu com Renato". "Todo mundo faz parte da história da banda. A história é uma coisa, mas direito da marca é outra. Existe a legislação, o Giuliano é o dono e não abre mão desse direito. Não queremos provocar um bate-boca. Se eles optaram por discutir na Justiça, é lá que vamos discutir", completou.

DECISÃO

Bonfá e Dado Villa-Lobos, que, ao lado de Renato Russo (1960-1996), formavam a Legião Urbana, obtiveram na quinta-feira (18) liminar na Justiça que permite a eles usarem a marca com o nome do grupo --algo que, segundo os músicos, a família de Renato os proibia de fazer.

A decisão foi tomada por Fernando Cesar Ferreira Vianna, juiz da 7ª Vara Empresarial do Tribunal de Justiça do Rio.

Segundo a liminar, Villa-Lobos e Bonfá podem, a partir de agora, agendar shows e eventos que contem a história do grupo. Os dois afirmavam estar sofrendo prejuízo financeiro ao deixar de participar desses encontros.

Caso a Legião Urbana Produções Artísticas descumpra a decisão, terá de indenizá-los em R$ 50 mil.

A empresa foi criada em 1987 para proteger os direitos autorais dos membros do grupo. Por causa da legislação, que restringe a uma única pessoa, física ou jurídica, a propriedade sobre uma marca, Renato Russo tomou a frente e se tornou o sócio majoritário da empresa, enquanto os outros ficaram como sócios minoritários.

Na época, a banda entrou com pedidos de registro da marca Legião Urbana no Instituto Nacional de Propriedade Intelectual. No entanto, os direitos sobre a marca só foram obtidos depois que Dado e Bonfá já haviam deixado a sociedade, e a a empresa passou aos cuidados da família de Renato Russo.


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