Folha de S. Paulo


Lobão diz que projeto de lei que prevê controle do Ecad 'é golpe'

Tradicional fio desencapado do rock nacional, Lobão voltou a dar choque na noite desta sexta (5), durante debate na Casa de Cultura de Paraty, como parte da FlipMais, evento agregado à festa literária.

Dessa vez, além de seus alvos de sempre --o rap, os esquerdistas, a MPB etc.-- ele atacou o projeto de lei que prevê a fiscalização do Ecad (Escritório Central de Arrecadação e Distribuição) pelo ministério da Cultura, aprovado na noite de quarta-feira (3), no Senado, com o apoio de diversos antagonistas do roqueiro, como Caetano Veloso e Gilberto Gil.

"Essa lei de proteção que eles estão fazendo é um engodo, um golpe. Eles vão pagar juros e correção monetária por terem posado ao lado de Renan Calheiros e da Dilma, isso vai ter volta. Aquilo não representa nossa classe, temos mais de 14 mil músicos que são contra aquilo", disse o cantor, que dividiu a mesa com o jornalista André Barcinski, colunista da Folha.

Lobão disse ainda que vai lançar uma nova edição de seu livro "Manifesto do Nada na Terra do Nunca", com um adendo a respeito das manifestações do mês passado. "[O protesto] não teve foco nenhum, começou por 20 centavos, dias depois estourou uma boiada que foi legal. Os patrulheiros ficavam dizendo 'isso não é nada, a Dilma está com 70% de aprovação' e eu ficava 'espera que isso é só o começo'. Na semana seguinte estava 30 pontos abaixo, eu pensei 'yes!'", disse o músico, provocando risos na plateia.

"Acho que a explosão que tirou o controle do MPL [Movimento Passe Livre] foi legal, mas agora está um clima de micareta."

O cantor lembrou ainda seu passado como militante do Partido Comunista e o fato de ter feito campanha para o PT nas eleições de 1989, depois das quais virou "consultor para assuntos aleatórios" e "tinha o celular do Lula". O apoio se repetiria em 2002, quando o partido conseguiria sua primeira vitória eleitoral para a presidência.

"Em 2002 eu me senti mais idiota ainda, porque fui reincidente. Subi no palanque do Luis Eduardo Dutra, fiz um monte de shows de graça. O Chico Buarque cobrava 140 pilas, o Zezé di Camargo 350, e eu zero. Pensava, esses caras são éticos, honestos. Quando entraram no governo, a primeira coisa que fizeram foi botar o Gilberto Gil no ministério [da Cultura], o que me deixou revoltadíssimo."

A essa decepção inicial, seguiram-se episódios como o do mensalão, que minaram o ânimo do cantor em relação ao partido. "Começaram a vir os escândalos de roubalheira e, em 2005, eu já estava com ódio do PT. Escrevendo o livro é que eu percebi que não era simplesmente o governo mais corrupto do Brasil, eles estão querendo dar um golpe comunista, institucionalizar o socialismo bolivariano aqui."

EXPLOSÃO DO POP NACIONAL

Antes da discussão enveredar pela política, Lobão e Barcinski conversaram sobre música --o colunista da Folha falou sobre o livro que está escrevendo e que tem como tema o pop rock nacional entre 1974 e 1983, período pouco estudado, segundo ele.

"A Jovem Guarda foi o primeiro movimento pop importante do país, mas, naquela época, o mercado de discos era muito pequeno, ainda não havia acontecido o 'milagre brasileiro' [período de grande crescimento econômico, entre 1969 e 1973]. A explosão do pop brasileiro se dá quando Secos e Molhados e Raul Seixas fazem seus primeiros discos", disse Barcinski.

Seu livro, que deve ser lançado até o fim deste ano, abrange o surgimento destes artistas e de outros como Raul Seixas, Novos Baianos e Guilherme Arantes, em meados dos anos 1970, até a geração de Ritchie e Lobão, em 1983.


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