Folha de S. Paulo


'Kafka e Baudelaire sussurram palavras que não se espera', diz ensaísta

As afinidades entre as obras do tcheco Franz Kafka (1883-1924) e do francês Charles Baudelaire (1821-1867), dois escritores que ajudaram a definir o conceito de modernidade na literatura, foram o tema da mesa que reuniu, na tarde desta sexta (5), o ensaísta e editor italiano Roberto Calasso e a pensadora suíça radicada no Brasil Jeanne-Marie Gagnebin.

Calasso, autor de "A Folie Baudelaire" (Companhia das Letras) e "K." --que, explicou, integram uma obra em andamento há mais de 30 anos, da qual já existem sete volumes--, disse que, embora as obras dos dois autores "aparentemente não tenham nada em comum", ambas têm a qualidade de fazer o leitor se sentir "imediatamente envolvido".

"Aquilo te diz respeito, é como uma palavra sussurrada num momento em que você não espera aquela palavra. Isso raramente acontece com escritores em geral, fazer o leitor se sentir puxado numa espiral labiríntica da qual você não sai enquanto não terminar", argumentou, para uma Tenda dos Autores cheia, no começo da tarde.

A filósofa Jeanne-Marie, estudiosa de Walter Benjamin --pensador que estudou os dois autores que eram tema da mesa--, destacou que Kafka e Baudelaire têm em comum o fato de terem dado uma "virada na nossa concepção de modernidade"

"Antes de Kafka, o caminho era reto, tranquilo, devagar, passo a passo, lento e se esperava chegar a algo certeiro. Temos com ambos gestos que atrapalham essa caminhada reta. Temos o tropeço".

Para Calasso, um outro escritor que se assemelharia a Kafka e Baudelaire no sentido de atingir o leitor seria Nietzsche. "Você pode amá-lo, odiá-lo, mas se sente imediatamente atingido."

Nesse sentido, eles seriam diferentes de um autor como Victor Hugo, que "era um versador mais hábil e feliz que Baudelaire, mas não toca no íntimo com a mesma certeza e voz da qual você não consegue mais se desfazer"


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