Folha de S. Paulo


Interpretação ambígua de atriz salva filme 'Augustine' do tom acadêmico

Em 2013 já tivemos o maravilhoso "Vocês Ainda Não Viram Nada", do mestre Alain Resnais. Eis um filme que dificilmente perde o título de melhor do ano.

Outro grande cineasta, Jacques Rivette, estará representado, já na próxima semana, com uma mostra quase completa de seus filmes em São Paulo. O cinema francês, em suma, está em alta por aqui.

Nesse cenário, "Augustine", da diretora Alice Winocour, que há pouco tempo seria saudado como um alento num mar de filmes insossos, tende a passar despercebido com sua modesta estatura.

Estamos no século 19. Uma garota de 19 anos tem crises de convulsões inexplicáveis. Mais do que isso, ela tem metade do corpo paralisado.

O diagnóstico aponta para mais um caso de histeria, algo na época associado exclusivamente às mulheres. É mais ou menos como hoje, quando sintomas não identificáveis são atribuídos ao estresse, o mal dos males.

O ator Vincent Lindon é Jean-Martin Charcot (1825-1893), o famoso neurologista que se encarrega de estudar o caso dessa garota com o auxílio da hipnose. Aos poucos, começa a sentir atração sexual por ela.

A pergunta que podemos fazer é: essa garota está fingindo as crises? Se está, é o tempo todo ou só de vez em quando? Ou só uma única vez? Estaria o célebre Charcot sendo enganado?

Uma das melhores coisas do filme é o trabalho de Soko. A atriz que interpreta Augustine carrega consigo um alto nível de ambiguidade. Ela parece fingir o tempo todo e, ao mesmo tempo, como finge bem. Sua força carnal abala o médico, balança suas estruturas científicas.

É disso que trata o filme. De um lado, o estudo, a contenção, a observação e a razão. De outro, a violência, o impulso, a natureza humana que ameaça a estabilidade e as regras da sociedade.

A diretora, estreante em longas, filma num tom sóbrio, usando o claro-escuro como retrato de pessoas em negociação com suas sombras. Por vezes o tom é sóbrio demais, torna-se acadêmico. O que predomina, contudo, é a ambiguidade. Ainda bem.

AUGUSTINE
DIREÇÃO Alice Winocour
PRODUÇÃO França, 2012
ONDE Reserva Cultural
CLASSIFICAÇÃO 14 anos
AVALIAÇÃO bom


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