Folha de S. Paulo


'Não tinha ninguém para revistar?', protesta pai de jovem morto na Virada Cultural

O pai do jovem Elias Martins Morais Neto, 19, que morreu neste domingo após levar um tiro durante a Virada Cultural, reclamou do policiamento responsável pelo evento. Com um olhar triste e desolado, ele ainda tentava entender o que tinha acontecido com o filho.

"Como pode um menino vir para uma festa desse porte e ser baleado? Não tinha ninguém para revistar as pessoas e ver quem estava armado?", disse Aurelino Santana, 49, enquanto aguardava a polícia finalizar o boletim de ocorrência no 3º DP (Campos Elíseos).

Violência durante a Virada provoca crise entre PM e Prefeitura de São Paulo
Dimenstein: Fui uma vítima da Virada
Dois homens morrem durante a Virada Cultural em São Paulo

Santana disse que estava em um culto religioso quando ficou sabendo da morte do filho, que foi baleado na cabeça na avenida Rio Branco, região central de São Paulo.

O jovem, que trabalhava em uma padaria em Interlagos (zona sul), tinha ido à Virada com um primo. A dupla foi abordada por outros dois homens na rua Santa Efigênia, segundo conta o primo --que não quis se identificar.

Elias entregou o celular e, depois, correu atrás dos criminosos. Perseguidos, os homens passaram pela rua Aurora --via onde fica o 3º DP-- e entraram na avenida Rio Branco. Um dos criminosos sacou uma arma e atirou na cabeça de Elias.

"O Elias achou que a arma era de brinquedo e saiu correndo atrás do cara. Eu tentei impedir, mas já era tarde", contou o primo, que tinha um corte no rosto por conta da briga com um dos assaltantes. Nenhum dos criminosos foi preso.

O jovem foi socorrido e levado ao pronto-socorro da Santa Casa, mas não resistiu e morreu logo depois.

Segundo a Secretaria da Segurança Pública, 3.500 PMs participaram do policiamento do evento e 15 pessoas foram detidas.

ARRASTÕES

Policiais militares ouvidos pela Folha dizem que foram registrados inúmeros casos de arrastões durante a madrugada. A reportagem flagrou pelo menos três deles nas avenidas Ipiranga, Rio Branco e Duque de Caxias.

A reportagem esteve entre as 2h e 3h no 3º DP (Campos Elíseos) e constatou pelo menos 15 casos de vítimas.

Policiais militares informaram que pelo menos 25 jovens foram detidos acusados de cometer os arrastões, na maioria deles menores.

Em todos os casos, a descrição é a mesma. Grupos de aproximadamente 50 pessoas passavam abordando os frequentadores da festa e, após agressões, arrancam à força celulares, carteiras, bonés e blusas.

"Arrancaram meu boné, meu tênis e minha carteira. Me chutaram quando estava caído. Levei um chute no rosto", disse o estudante C., 16, enquanto era atendido na delegacia.

O ajudante de serralheiro Jeferson Silva, 19, foi agredido antes de ter o celular e o boné roubados. "Eles chegam gritando 'olha o bonde' e roubam tudo", disse Silva, roubado quando saía de um dos palcos em direção ao metrô, acompanhado de três amigos. Todos tiveram os pertences levados.

"Chegavam, arrastavam a gente mesmo, juntavam e e arrancavam tudo, corrente, tênis, carteira", disse o conferente Fabio Viana, 24. "A gente vem para se divertir e acaba sem nada".

Na maioria dos casos, os policiais de plantão nas delegacias orientam a fazer o registro da ocorrência pela internet, pois os crimes são considerados furtos. Porém houve casos de pessoas que foram rendidas por pessoas armadas.

"Pior é que está cheio de PMs nas ruas. É muita gente, impossível evitar", disse um policial militar à Folha.

RECLAMAÇÕES

Participantes da Virada vítimas de ladrões reclamaram do policiamento. "Os PMs ficam nas viaturas, nas esquinas. Não estão a postos para evitar os roubos. Só nos orientam a fazer o boletim de ocorrência. Na delegacia, querem que a gente registre pela internet", disse Stefani Fernanda, 21, enquanto aguardava por informações no 3º DP.

Ela afirma que foi roubada quando aguardava um ônibus no ponto da avenida São João. "Estavam armados. Pediram o celular e a carteira e eu dei. Roubaram outros que estavam no ponto também", disse ela, que mora no Jaraguá (zona norte).


Endereço da página:

Links no texto: