Folha de S. Paulo


A coroa me caiu como uma luva, diz Corona, que gravará novo disco

Era uma vez em Florença. Olga Maria de Souza, uma carioca recém-chegada à Itália, dançava e cantava a plenos pulmões na pista de uma discoteca e foi descoberta por um produtor. Meses depois, transformada em Corona --"a coroa caiu como uma luva"--, ela gravou clipe do hit chiclete que grudou nas paradas musicais.

No mundo dela, existe antes e depois de "The Rhythm of the Night". Corona pode ser nome de uma ducha ou de uma popular marca de cerveja, mas coroou a realeza brega e inequívoca da música dance durante um par de anos na década de 1990.

"Rhythm", lançada em 1993, ficou 13 semanas seguidas no topo das paradas italianas e chegou ao segundo lugar no Reino Unido. Tem hoje mais de 52 versões, da escrachada "Jesus humilha o Satanás" --é só cantarolar no ritmo, que faz sentido-- a outras traduções menos inspiradas.

Duas décadas depois, sendo a última delas em relativo ostracismo, Corona, 44, quer voltar a reinar nas pistas de dança. "Queen of Town" é o primeiro single de seu novo disco, que será gravado em São Paulo, onde ela voltou a viver.

Não foi só a mudança de Roma para a capital paulista. Corona trocou as trancinhas afro que marcaram seus primeiros clipes por uma peruca ondulada, armada e sintética, tão plástica quando sua sonoridade pegajosa.

Numa tarde de outono, ela encontrou a Folha num café da avenida Faria Lima, em São Paulo. Na entrevista a seguir, Corona lembra os anos dourados e conta por que voltou para casa.

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Folha - Muitas pessoas nem devem lembrar que você é brasileira.
Corona - Eu sou do Rio. A maioria das pessoas vem conversar comigo em inglês, pensam que eu sou jamaicana, sul-africana. Mas morei tanto tempo em Roma e fico tanto tempo viajando, que as pessoas não sabiam mesmo. Mas cheguei a gravar até bossa nova. Escrevi uma música em português chamada "Cor dos Teus Olhos".

"The Rhythm of the Night" se tornou um sucesso nas pistas de dança. Qual é a história por trás dessa música?
Era para eu ser backing vocal de uma dupla de DJs, mas eles adoraram a minha imagem, meu jeito explosivo de rir. Me acharam divertida. Essa coroa encaixou direto na minha cabeça, foi como uma luva. Eles queriam que essa fosse a música daquele verão na Europa. E foi. Acharam que tinha que ser eu, a Olga Maria de Souza.

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E o que houve depois de "Rhythm"?
Ninguém esperava isso, foi um grande hit. Depois teve "Baby", "I Don't Wanna Be a Star" e "Try Me Out". Até 1998, eu tive muita repercussão. Mas "The Rhythm of the Night" sempre foi a mais falada. Foram anos de correria. Depois não teve todo esse glamour, tinha menos glamour, não estava mais tanto na mídia. Virei madrinha de paradas gays, fui tocar outros projetos. Agora é que a nova geração começou a descobrir "The Rhythm of the Night".

Foi um sucesso "pazzesco" [louco]. O lado negativo é que as pessoas não me deixam cantar outras coisas, não me deixam ir para a frente. Todo mundo quer que eu cante "The Rhythm". Pedem "Canta 'The Rhythm', que eu quero sonhar de novo". Mas tem muitos cantores que gostariam de ter um passado como esse. Ninguém pode continuar a vida toda como uma planta pequena.

Como surgiu a imagem da Corona? Você se considera uma diva da música dance?
Não acho que eu sou uma diva. Quando a Corona começou, muitas pessoas se inspiraram, foi uma geração em transformação, e eu fiz parte dessa mudança. A Itália é rica em "stylists", não é? Tinha Valentino, Dolce & Gabbana. Eles vinham e me ofereciam. Já ganhei guarda-roupas inteiros da Dolce & Gabbana, da Armani. Eu gostava dessas coisas.

Queriam fazer uma boneca da Corona, mas não deu certo, porque ela tinha que ter as tranças. Era muito cabelo, e muitos dentes, porque eu dou muita risada. Eu ia fazer show e via todo mundo na plateia com a trança igual a minha.

Quando você não está na balada, que tipo de música você gosta de ouvir?
Para mim, música é tudo. Até uma gota de água caindo na panela que está na pia para lavar é música. Eu gosto de tudo, da Whitney Houston, da Aretha Franklin, do Stevie Wonder, do Gilberto Gil, do Caetano Veloso, do Roberto Carlos, do Erasmo Carlos, do Milton Nascimento. O mundo está contaminado pela música.

Sua mudança para o Brasil tem a ver com a crise econômica na Europa?
A crise para mim não existiu ainda, mas crise tem no mundo inteiro. Mesmo assim a música sempre foi "avanti" [para a frente]. Mas por mais que tenha crise, a música sempre levanta as pessoas.


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