Folha de S. Paulo


"A ciência perdeu, o samba perdeu", diz Paulinho da Viola sobre a morte de Vanzolini

À Folha, artistas lamentaram a morte do compositor Paulo Vanzolini, no fim da noite do último domingo (28), aos 89 anos. O cantor Zeca Pagodinho lembrou o legado de composições do paulistano e disse se arrepender de não tê-lo conhecido pessoalmente.

Vanzolini foi o poeta das pequenas tragédias
"Cansei de ver mulher chegar no bar", disse
Zoólogo, Vanzolini teve grande importância para a ciência
Vanzolini foi muito mais que um cronista de São Paulo
Xico Sá: Vanzolini, cascavéis e o amor que rasteja

Já o músico e compositor Guinga resumiu: "São gênios como Pelé, Chico Buarque, Milton Nascimento que compensam as mazelas do Brasil. Vanzolini era um gênio".

Vanzolini estava internado desde quinta-feira (25) na Unidade de Terapia Intensiva do hospital com pneumonia grave. A causa da morte ainda não foi informada pela família.

Um dos ícones do samba paulistano, criou clássicos como "Ronda", "Volta por Cima" e "Praça Clóvis", interpretados por grandes nomes da MPB, como Chico Buarque, Maria Bethânia e Paulinho da Viola.

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Leia abaixo a repercussão da morte do compositor Paulo Vanzolini:

"A ciência perdeu, o samba perdeu, enfim, todos nós perdemos uma figura humana muito especial."
PAULINHO DA VIOLA
compositor e cantor, à Folha

"Toda vez que se pensa na música de São Paulo, lembra-se destas duas figuras: o Adoniran e o Vanzolini, são os dois grandes representantes. Ele acabou instituindo oficialmente também aquela coisa da ronda noturna que se faz em busca de alguém na noite. Em uma canção ele conseguiu registrar momentos, lugares, situações de um romance e cenas que se repetem em bares. 'Ronda' é um marco, foi gravada por grandes intérpretes da música brasileira."
JOÃO BOSCO
compositor, violonista e cantor, à Folha

"Não cheguei a conhecer o Vanzolini pessoalmente, mas tem um bocado de música, uma obra grande. É uma perda imensa. Fez 'Mente', que eu pensava que era do Gudin com o Paulinho Pinheiro, mas era do Gudin com ele. Teve 'Ronda', aquela coisa bem doída, dos boêmios e de quem sai na noite à procura de quem ama. Que Deus o tenha. Se lá no céu tiver música, espero que ele continue fazendo."
ZECA PAGODINHO
cantor e compositor, à Folha

"Ele e Adoniran foram símbolos, foram o que há de mais representativo de São Paulo. Era muito amigo meu. Nos conhecemos no começo da minha carreira, quem nos apresentou foi o Marcus Pereira, e nos tornamos amigos, bebemos alguns copos. Gravei música dele. O impressionante é que ele não era muito ritmado, mas conseguia fazer músicas belíssimas. Era um intelectual, mas ao mesmo tempo um compositor popular, um boêmio brasileiro."
MARTINHO DA VILA
compositor e cantor, à Folha

"Em 1968, o Jogral era o bar do Carlos Paraná, ficava na Rua Augusta e era frequentado pela boemia paulistana. Um deles, que habitualmente bebia sua pinguinha por lá, era Paulo Vanzolini. Eu já tinha amizade com ele, um letrista com quem sempre quis fazer alguma coisa. Numa noite, no Jogral, ele chegou para mim e escreveu em um papelzinho duas estrofes. Fiquei com aquele papel, e demorei para fazer a música. Criar uma melodia para uma letra já pronta é um grande desafio. A melodia tem de ter força própria, parecendo que foi feita independente da letra. Ainda mais uma letra de Paulo Vanzolini, objetiva, concisa, exata. Por isso foi trabalhoso achar uma linha melódica natural para "Boca da noite", minha primeira canção com Paulo Vanzolini. Depois fizemos mais duas canções, "Noite longa" e "No fim não se perde nada". Vanzolini tinha um estilo próprio de compor e de viver. Cientista da vida e da palavra objetiva. Mais uma lacuna para a cultura brasileira."
TOQUINHO
compositor e violonista, à Folha

"Sinto muitíssimo a morte do Paulo Vanzolini. Grande compositor, com estilo mais que definido. A notícia que me chegava do seu modo de viver, sempre me encantou. Com duas profissões bem vividas, uma falta que será sentida por toda música brasileira. Tive a felicidade de cantar dois grandes sucessos dele, duas lindas canções: 'Ronda' e 'Volta por Cima'. Que Deus o receba com alegria."
MARIA BETHÂNIA
cantora, à Folha

"Ele foi um exemplo único na ciência brasileira. Foi um grande cientista, um dos biólogos mais importantes do seculo 20. Ele participou ativamente da revolução que aconteceu na biologia na segunda metade do século 20. Além disso, foi ainda um músico maravilhoso. A produção científica dele foi do mesmo nível da produção musical. Ele foi meu professor na Faculdade de Medicina da USP, no início dos anos 1960. Sempre tive uma admiração enorme por ele. Era um homem exemplar. Interessadíssimo em ciência, mas que também tinha interesse em outras áreas."
DRAUZIO VARELLA
médico, escritor e colunista da Folha

"Conheci o Vanzolini no início da minha vida musical, aos 17 anos. Ele ia religiosamente ao meu bar [Bar do Alemão], todos os sábados. Fizemos muitos shows juntos. É um pedaço meu, da minha vida. 'Mente' foi nossa parceria que mais tocou. Antes de ser parceiro, eu era amigo dele. Quando comecei, lá no Jogral, com uma relação muito forte, a vida inteira. Nossa parceria só não teve 30, 40 músicas, porque fazíamos quando dava. Quando eu fui conhecendo a música dele, eu chegava para o Adauto Santos, lá no Jogral, e falava: agora só toca Vanzolini. E ele tocava todas as músicas do Vanzolini. Eu tinha uma ligação importante com ele na parte artística. 'Ronda', eu que fiz a Márcia gravar. A música era conhecida no boca-a-boca, mas ainda não tinha tido uma gravação mais comercial. A Inezita gravou, mas não tocou, foi o lado B do 'Marvada Pinga'. Essa música era tocada por todo mundo, tinha uma vida própria. Eu tenho duas letras dele. Uma eu achei, mas a outra terei de procurar, tenho de fazer a música primeiro. Mas não pretendo gravar, se não puder mostrar para ele, não tem graça."
EDUARDO GUDIN
compositor, violonista e parceiro de Vanzolini, à Folha

"Paulo Vanzolini foi um grande sambista, dos maiores que São Paulo produziu. Sua música é parte do repertório afetivo da cidade. O cantor, compositor e zoólogo também foi um dos raros seres humanos que conseguiu viver a ciência e a arte com igual desenvoltura. Isso sem jamais deixar de aproveitar o que a vida nos oferta de bom: sabia, como ninguém, que a alegria é a prova dos nove. Entendo que não há forma melhor de homenagear Vanzolini do que celebrar sua vida com shows de música, em especial de samba, seu gênero de predileção. Vanzolini simbolizava a forma singular de o brasileiro viver a liberdade e por isso sua memória permanecerá."
JUCA FERREIRA
secretário municipal da Cultura de São Paulo, em nota

"O Vanzolini não era só um grande sambista, mas um grande compositor, um homem de ideias da cultura brasileira. Além dele e Adoniran, São Paulo tem grandes compositores como o Gudin, o Roberto Riberti, eu ficaria aqui citando uma porção deles. Foi um compositor de grande valor, contribuiu para a cultura brasileira no campo musical com obras monumentais. E a zoologia só enriquece o seu histórico. Me honra muito ser um admirador e parceiro do Vanzolini."
ELTON MEDEIROS
compositor e cantor, à Folha

"Foi um grande compositor, grande autor. Vai fazer suas obras lá no céu. Nós, aqui na Terra, ficamos mais pobres. Sua obra deveria ter sido mais comentada e mais badalada na mídia. Paulo Vanzolini não foi um compositor de 300 canções, mas fez uma que vale por 300, que é 'Ronda'."
NELSON SARGENTO
compositor e cantor, à Folha

"São Paulo, contradizendo aquilo que Vinicius declarou certa vez, é um celeiro de grandes compositores --e jamais o túmulo do samba. Era pura provocação do Poeta, tenho a certza. Adoniran, Paulo Vanzolini, Eduardo Gudin, Luiz Tatit --a lista é enorme-- são a prova de uma criação originalmente brasileira que a mim, especialmente, emociona. E a perda de Vanzolini não é só lamentável no plano da música, mas também no da ciência. Era um sábio com que, infelizmente, não tive a honra e o prazer de conviver, mas apenas saber de suas histórias através de amigos que tenho aí como o Helton Altman, Alexandre Pavan, Inezita Barroso. Perde a nossa cultura um de seus nomes mais importantes."
HERMÍNIO BELLO DE CARVALHO
poeta, compositor e produtor, à Folha

"Eu tive a sorte de conhecer meus ídolos, como o Adoniran, o Nelson Cavaquinho e o Vanzolini. Ao lado do Adoniran, ele foi um grande representante não só do samba de São Paulo, mas da música brasileira. Estavam no mesmo patamar. Aquele disco dele 'Onze Sambas e Uma Capoeira", eu sabia de cor. Fiz um show com ele em fevereiro, no Sesc Belenzinho, tocando esse disco inteiro. Ficamos muito amigos na época em que éramos boêmios na noite. Ele falava uma coisa muito interessante sobre 'Volta por Cima': dizia que as pessoas falavam 'levantar a poeira e dar a volta por cima', mas ninguém falava em 'reconhecer a queda', que era o mais importante, segundo ele. Até o fim da vida ele frequentava as rodas de choro e valorizava muito os músicos e os cantores da noite."
CARLINHOS VERGUEIRO
cantor e compositor, à Folha

"Eu não tive o prazer de conhecer o Vanzolini, mas, é claro, sempre gostei muito dos sambas dele -- que conheci, em um pequeno conjunto, no maravilhoso disco gravado por Paulo Marquez e Carmem Costa, para a gravadora Marcus Pereira. Foi um grande cronista do samba, com um realismo contundente, lírico e trágico; e também um aguçado senso de humor, comparável ao de Billy Blanco e poucos outros. Foi um "cientista do cotidiano", além de cientista de verdade."
NEI LOPES
compositor, escritor e pesquisador, à Folha

"Era um cara tão importante, com uma obra tão bonita, é difícil mensurar o tamanho de um cara como Vanzolini. Ele e Adoniran conheceram São Paulo como ninguém. Mas não localizo ele apenas em São Paulo, o bem que ele trouxe foi para o samba brasileiro. Claro que tem aquela coisa paulista, mesmo sendo um grande poeta, ele colocou a prosa no samba do jeito que nenhum carioca fez, aquela coisa da crônica que extrapola São Paulo. É muito triste."
TERESA CRISTINA
cantora, à Folha

"Além de cientista laureado e mundialmente reconhecido, Paulo Vanzolini é indiscutivelmente o representante máximo do samba paulista, cultuado até hoje pelos jovens de todo o país, e, pra minha surpresa, como assisti durante um pré-Carnaval no Rio, reverenciado pela velha guarda dos sambistas de lá."
PAULO CARUSO
cartunista, à Folha

"Foi um grande compositor, um grande músico, um grande letrista, uma figura maravilhosa. Todo mundo canta 'Ronda' até hoje. A música de verdade, como a dele, fica para sempre, pode tocar a vida inteira."
WILSON DAS NEVES
baterista, percussionista e compositor, à Folha

"São gênios como Pelé, Chico Buarque, Milton Nascimento que compensam as mazelas do Brasil. São pilares, baluartes da nossa existência. O Vanzolini era uma dessas pessoas, um gênio. Fez 'Mente', uma obra-prima que aparece de 30 em 30 anos. Ele ajudou a construir um Brasil melhor com sua música e seu caráter."
GUINGA
compositor, violonista e cantor, à Folha

"Foi um dos maiores compositores do Brasil. Era cobra. Compôs o hino de São Paulo, 'Ronda'."
JARDS MACALÉ
músico, à Folha

Colaboraram LUCAS NOBILE e MARCO RODRIGO ALMEIDA, de São Paulo


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