Folha de S. Paulo


Diretor de "A Dama do Lotação" estreia na literatura

Neville d' Almeida ganhou fama, grandes bilheterias e muita dor de cabeça com seus filmes recheados de sexo e atrizes nuas.

Ao estrear na literatura, importou a mesma temática. Não deu outra: viu-se novamente no meio de uma polêmica.

"A Dama da Internet", seu primeiro romance, foi apreendido em janeiro de uma livraria de Macaé (RJ) por ordem da Justiça.

O juiz de segunda Vara de Família, da Infância e da Juventude e do Idoso de Macaé determinou que obras eróticas vendidas sem embalagem lacrada fossem recolhidos.

Além do romance de Neville, foram levados da livraria Nobel outros três títulos, totalizando 18 exemplares.

"Isso é um absurdo, não faz sentido. Jovens de 16, 17 anos têm acesso a qualquer tipo de material. É censura, já estou acostumado a isso", diz Neville.

Durante a ditadura militar, vários de seus filmes tiveram problemas com a Justiça. "Jardim de Guerra" (1970) e "Piranhas do Asfalto" (1971), seus dois primeiros longas, foram interditados pela censura e nunca exibidos comercialmente em salas de cinema.

Inspirado em texto de Nelson Rodrigues, "A Dama do Lotação", que fez 6,5 milhões de espectadores em 1978, teve, segundo o diretor, sete minutos cortados --todos de cenas de sexo e nudez. De "Rio Babilônia" (1982) foram censurados quase 15 minutos.

"O sexo choca hoje como chocava há 30 anos. Ainda existe muito moralismo, muita hipocrisia. O artista tem sempre que se rebelar contra isso. Eu, pelo menos, sempre tentei."

"A Dama da Internet" retrata a trajetória de liberação sexual de Luísa. No começo do livro ela é uma moça ingênua, prestes a realizar seu maior sonho, casar.

A rotina do casamento vai revelar que o marido, além de infiel, é um completa boçal. Revoltada, Luísa se dedica a fazer gato e sapato dos homens --que no livro são, quase todos, igualmente infiéis e boçais.

Terá como armas de sua vingança as minissaias, os vestidos decotados, uma lingerie vermelha e, principalmente, as redes sociais, que lhe revelam um mundo de encontros eróticos e fantasias.

"O Facebook é um caminho de libertação", define Neville. "Trinta anos atrás, se a mulher fosse perguntar para o pai ou para o marido alguma coisa sobre sexo anal, ia ser chamada de puta. Agora ela pode encontrar na internet as coisas mais íntimas sobre taras, desejo e perversões."

Além do título, "A Dama da Internet" tem nítidas semelhanças com "A Dama do Lotação". Em ambos uma mulher insatisfeita com a vida de casada parte para novas aventuras.

Não falta no caminho de Luísa nem mesma a cena de bolinação dentro de um ônibus, tal como ocorre com a personagem de Sonia Braga no filme, um dos maiores sucessos do cinema nacional.

Neville, no entanto, diz haver "diferenças crucias" entre eles. "São contexto totalmente diferentes. No filme, a mulher estava no início do processo de liberação da sexualidade. Ela se entrega a vários homens para continuar amando o marido", diz.

"Já o livro fala da mulher do século 21, que quer colocar os homens em seus devidos lugares. Quer fazer com os homens o que eles têm feito com as mulheres nos últimos 5.000 anos. Não tenho o mínimo interesse em fazer um `Dama do Lotação 2'."

Neville também refuta que tenha escrito seu livro para mergulhar na onda de sucesso erótico capitaneada pela série "50 Tons de Cinza".

Na verdade, conta, só leu o livro de E. L. James depois de ter concluído seu próprio romance --e mesmo assim não conseguiu passar da página 80.

"O '50 Tons' tem a moral do século passado. Traz uma mulher submissa e um homem machão, que acha que pode comprar qualquer mulher. A autora do livro escreve como homem. Já eu escrevo como mulher."

"A Dama da Internet" nasceu em forma de roteiro para cinema, há quatro anos. A convite da editora Casa da Palavra, Neville transformou a história em romance.

Mas a ideia original ainda persiste. Ele pretende filmar o roteiro ainda neste ano.

A DAMA DA INTERNET
AUTOR Neville d'Almeida
EDITORA Casa da Palavra
QUANTO R$ 24,90 (160 págs.)


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