Folha de S. Paulo


Diretor do Victoria and Albert Museum vem ao Brasil para estabelecer acordo com MinC

Martin Roth, diretor do Victoria and Albert Museum, maior museu de artes decorativas e design do mundo, chega ao Brasil na semana que vem para discutir um acordo a longo prazo com o Ministério da Cultura, a convite da ministra Marta Suplicy. Ela visitou o museu em dezembro do ano passado.

Roth é o primeiro não britânico a comandar o Victoria and Albert Museum. Nascido em Stuttgart, na Alemanha, em 1955, afirma que o pós-guerra fez com que quisesse ser mais um cidadão global do que propriamente alemão. Segundo ele, sua contratação (em setembro de 2011) para a diretoria do museu é um sinal de que o governo britânico está aberto a inovações; ele quer encabeçar esse movimento. "Temos quase que a responsabilidade de trabalhar com outros lugares do mundo de onde as melhores ideias estão vindo", diz, sobre o Brasil.

Além da exposição planejada para o Museu Nacional da República, vem ao país em janeiro do ano que vem a exposição "David Bowie Is", que bateu o recorde entre museus britânicos de ingressos vendidos antecipadamente (40 mil). Os artigos de memorabilia do cantor, atualmente expostas no Victoria and Albert Museum, serão exibidas em São Paulo, no Museu da Imagem do Som.

Peter Kelleher/Divulgação
Martin Roth, diretor do Victoria and Albert Museum, que vem ao Brasil na semana que vem
Martin Roth, diretor do Victoria and Albert Museum, que vem ao Brasil na semana que vem

Em entrevista à Folha, Roth contou que a parceria começará no ano que vem com uma exposição feita pelo museu britânico especialmente para o Museu Nacional da República, em Brasília.

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Folha - Por que interessa estabelecer uma parceria a longo prazo com o Brasil?
Martin Roth - O Brasil está mudando -- por muito tempo, girou em torno do eixo Rio-São Paulo, mas de repente o mundo percebeu que o Brasil é maior que isso, que é também Minas Gerais, Santa Catarina, Mato Grosso... Já estive várias vezes no Brasil e percebi quanto novas ideias tem sido desenvolvidas, diferentemente do que ocorre no Reino Unido.

Que novas ideias? O sr. pode dar alguns exemplos?
O Instituto Inhotim [museu a céu aberto em Brumadinho, MG] é um belo exemplo. É um lugar onde a cultura, as artes e a natureza se encontram de uma maneira que nunca foi feita antes. É muito importante. O design e a arquitetura contemporânea são muito empolgantes. Vocês têm, em geral, ótimos museus e fundações. Sou grande fã do Museu da Maré, no Rio de Janeiro, por exemplo.

Como será a exposição que vem ao Brasil no ano que vem?
Não quero levar algo que já faça parte do nosso programa ou que seja uma exibição itinerante. Quero levar algo que seja feito especialmente para Brasília e ao Museu Nacional da República. Será relacionado à Copa do Mundo e o ideal é que seja próximo à data em que vai ocorrer. Mas ainda é cedo para falar sobre isso, preciso sentar para conversar com a ministra da Cultura a respeito. Ano passado, conversamos quando ela foi visitar o Victoria and Albert Museum em Londres. Foi ótimo conversar com a ministra porque ela tem uma visão e comprometimento muito claros em relação a essa parceria que queremos estabelecer.

Como funcionará essa parceria?
Acredito fortemente na troca mútua, seja entre países ou entre pessoas. Com a comunidade global que vive aqui em Londres, temos quase que a responsabilidade de trabalhar com outros lugares do mundo de onde as melhores ideias estão vindo, onde temos pessoas criativas. Mas devo ressaltar que estou interessado em uma parceria a longo prazo, com intercâmbio de trabalho entre os países e trabalhos de pesquisa conjuntos. Não me interessa pequenas coisas, como uma exibição aqui e outra ali -- nós podemos fazer mais e de melhor forma. Eu adoraria ter algo permanente do V&A no Brasil, algo que fizesse parte da marca do nosso museu. Seria perfeito.

O sr. conhece o Museu Nacional da República?
Conheço, já o visitei em outra ocasião. Eu gosto da ideia de que o museu fica no centro da nação. É um grande desafio porque não é exatamente fácil de lidar. É um espaço lindo e com uma estética incrível, mas não é neutro, não é funcional, não é um cubo branco. É por isso que a exposição tem de ser feita especificamente para o museu. Queremos enfrentar esse desafio.

Recentemente, foi inaugurado o Museu de Arte do Rio (MAR) no Rio de Janeiro. Falou-se em um "surto museológico" no Brasil. Na sua opinião, é possível haver um excesso de museus?
Não posso falar do Brasil especificamente porque não sou um especialista em museus brasileiros. Mas atualmente, temos uma inflação de museus em todos os lugares em que a economia está mudando, como na China, na Índia e no Brasil. Acredito que é preciso ter uma coleção decente, que valha a pena ser exibida, para construir um museu. Na China, por exemplo, vi pessoas dizendo "precisamos de um museu", mas não havia coleção, então museus foram construídos por questões políticas, mas não havia nada dentro. Museus sem objetos são como teatros sem performance, ou como um caso de amor sem amor. Se não há coleção, não há alma do museu.

A ministra Marta Suplicy tem dito que o Brasil tem grande potencial para exercer seu "soft power", ou poder de influência, por meio da cultura. O sr. concorda?
Absolutamente sim. O Brasil tem um poder cultural incrível. Primeiro, a formação do povo brasileiro: ao mesmo tempo em que é português, é africano e indígena também, sem contar a imigração. É um país com nível de impacto cultural muito alto. A primeira vez que eu fui ao Brasil foi em 1998. O Brasil daquela época e o de agora são completamente diferentes. As pessoas não estão de certa forma "deprimidas" como estavam naquela época, elas estão empolgadas com a situação atual do Brasil. E vocês têm muito potencial para contar grandes histórias para o mundo. A arte brasileira é muito empolgante.

Por que a exposição sobre o David Bowie fez tanto sucesso em Londres?
Eu não esperava que fosse atrair tanta gente, mas faz sentido porque o Bowie mudou nossas vidas, no mundo inteiro. Ter dito "sejam quem quiserem ser" foi importante para todos nós. E a mostra é um ótimo exemplo de como as exposições serão no futuro: uma combinação de moda, artes, imagens em movimento e música. Vale a pena ir vê-la.


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